quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

O afogando da piscina vazia -Rolando Vezzoni

Mergulha de cabeça na piscina, pois não haveria outro jeito.
A água é rasa, mais rasa do que deveria ser quando se pula de cabeça.
O crânio nunca é o bastante nessas horas, e é hora de sair e tudo dói e gira sangrando o crânio...
Sobreviver é algo relativamente comum, mas feridas e cicatrizes são inevitáveis, e vai se lembrando disso conforme deita no gramado do jardim vazio, após sair do buraco, esperando alguém aparecer para lhe prestar socorro.
Mergulha de cabeça no delírio pós-traumático.
Está agora em uma calçada, sabendo que sonha, é sonho pois não há nada que segue a ultima gota vermelha, e cabeça dói como a sua real deve estar doendo no mundo desperto.
É uma rua, avenida ou algo do tipo, das bem grandes, e lotada de pessoas indo e vindo, tudo muito normal como deveria ser, até que começa andar e se percebe preso a uma esfera de ferro por uma corrente, move-se devagar pelo peso daquilo, como um preso de filmes antigos ou desenhos do Pernalonga.
-Ei! Tem uma porra presa na minha perna!- exclama na procura inútil de atenção.
Os outros olham com desconcerto e prosseguem andando num ritmo anormal e desconfortável, simplesmente se esforçando para continuar.
Todos estavam acorrentados.
Vai andando, é o jeito, se contextualizar naquela tão real irrealidade.
-Ei! Você!- lá de trás.
-Eu? -virando-se
-Tu! Não "ele" -diz uma réplica sua.
-Nós?
-Vós! Sua voz! é igual a minha, como a sua cara e o resto! Somos você!
-E eles?
-Não! Mas sim... Tudo ideia sua!
-Como assim?
-Estamos na sua cabeça gotejante!
-Já desisti de ficar confuso a respeito disso...
-Beleza!
Começam a caminhar sentindo o peso irritante, eles não, ele,seu sósia não carregava peso algum, era o único não acorrentado.
-Tem alguma mensagem que você vai me passar, o sentido da vida ou algo do tipo?
-Você anda vendo muito filme, não?
-Sei lá... Aí teria alguma utilidade, mas não existe isso.
-Nada é útil.
-E pra onde vai essa rua aqui?
-Pra nenhum lugar, só vai indo sem sentido.
-Isso me incomoda.
-A mim não, sempre gostei, desde criança.
-Como?
-Ora, não é assim a vida?
Concorda em silêncio, afinal, sim, a vida é assim.
-E você é o único não acorrentado a esse peso por alguma razão?
-Bom... Eu não sou vivo, sou apenas um ideia sua, com a simples função de...
-Passar o tempo?
-É!
-E os outros, eles também são ideias, e carregam o peso.
-Mas são ideias vivas, projeções de um conjunto de pessoas reais.
-Quando idéias vivem?
-Nunca vivem, mas sempre ilustram a vida...-Respira fundo- Ei!
-Que foi?
-Abraço!
As luzes mudam, está tudo voltando, há pessoas envolta e tudo certo, não vai acontecer nada, nenhuma lesão dizem os doutores, acordou socorrido.
Grande piada a sua sr. doutor... Tudo deixa lesão, a vida é vida por lesionar, a unica coisa que não lesa é a morte, nosso vetor paralelo que nos ensina a gozar viver.

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