segunda-feira, 26 de julho de 2010

PAUSA.... - Giselle Probst

Amar,
Admirar uma pequena beleza junto a alguém,
Parar e apenas sentir o que vem,
Sorrir e admirar....


Amar,
E ter sempre alguém com quem sonhar,
Sonhar junto sobre algo comum,
Sorrir, de novo, admirar...

Amar,
Ter o coração batendo no mesmo compasso,
Andar no mesmo passo, sem pressa,
Até encontrar a paisagem bela e, então,
Sorrir, de novo, admirar...

Amar,
Única pausa no tempo permitida,
Pausa plena de sentido.
Não mais importa o que se foi ou
O que será!
É o todo que se revela,
Quando se abre o sorriso,
E se admira a vida...

Papel na Caneta - Lígia Fernandes

Luis Felipe Angell, Sofocleto, disse que escrever é uma maneira de falar sem sermos interrompidos; Erasmo de Rotterdam pronunciou que o gosto pela escrita cresce à medida que se escreve; Eugène Ionesco, que devemos escrever para nós mesmos, é assim que poderemos chegar aos outros.

Thomas Mann informou: o escritor é um homem que mais do que qualquer outro tem dificuldade para escrever, mas foi Clément Marot o primeiro a abrir a boca: um homem não pode bem escrever se não gostar um pouco de ler!

Entretanto, são as palavras de Benjamin Franklin que me causam uma dúvida constante, pois disse uma vez que ou escreves algo que valha a pena ler, ou fazes algo acerca do qual valha a pena escrever. Porém, na maioria das vezes, lembro-me e ouço as vozes dela, Virginia Woolf, citando:escrever é que é o verdadeiro prazer; ser lido é um prazer superficial e, por isso, acabo optando pela segunda alternativa de Franklin.


E, por fim, segue o conselho de Sêneca: procura o que escrever, não como escrever.

domingo, 25 de julho de 2010

O salto quebrou - Giovanna Palermo

Por que insistem em esperar o cavalo branco que não vem,
O casamento lindo que termina em divóricio,
Os filhos prendados que vivem de tudo, menos do ócio,
E o amor infindo, mas que só novela tem?

Por que perder as noites em claro,
Recitar mil vezes o nome do amado,
Acreditar em conto de fadas,
E esquecer de subir por si própria, as próprias escadas?

Pra que querer ser princesa,
Ostentar a imagem de família da realeza,
Enquanto se briga com o marido e chora ao por a mesa?

Pra que se submeter quando se é forte,
Felicitar-se na mudança de sobrenome
E se conter virando um simples mascote?

quinta-feira, 22 de julho de 2010

Ode a infelicidade.- Francisco Knulp

Ó maravilhosa falta de alegria!
Ó visão que desmascara toda a alegoria!
Ó infelicidade que me vem,
me faz esse nenhum bem!
Dentre paginas que me afastam de toda essa euforia
todo santo dia!

É tão nobre um jovem ser assim!
É tão nobre alguém ser assim?
Assim, quebro-me como giz,
E sei o que o mundo me diz...
vou me ver sempre, enfim,
Satisfeito,sim, por ser infeliz.

canto mudo- Lígia Fernandes

Música para os ouvidos.
Música para os ouvidos, para purificar a alma, para a vida rodar e a roda viver - ou a vida viver e a roda rodar.

Como é puro o dedilhar no piano, o mais puro movimento. Puro como a suavidade das cordas do violino ao encontrarem as cerdas do arco. E o braço direito que se movimenta numa leveza esplêndida.

E a união - tudo na mais perfeita e simples harmonia!
É momento de relaxar, lembrar e relembrar. Reviver!

Fá sustenido:
e deixe o som soar e invadir o espaço. Entrar por um ouvido, depois pelo outro. Invadir teu corpo e abraçar tua alma. E, aos poucos, notará teus braços subindo e descendo, contornando os compassos e seguindo as notas.

Feche os olhos
- assim o coração pode ouvir melhor...

2000, 2012- Rolando Vezzoni

o fim do mundo
é onde o homem raso nada,
e escorre junto com o nada.
olhe agora além do fundo...

é o eco do grito mudo,
ouvir do ouvido surdo?
idéias gotejando paralelamente,
estas perturbam sua mente?

este mundo que aqui está,
a muito está aqui
e assim ainda estará,
quando o suposto fim chegar a ti.

então deixe desesperar-se,
e não falo por gatos e telhados,
lhe digo de pronto:
-não haja como tonto!

presente para o café puro- Nico Ascenção

Expresso, capuccino, pingado
Mineiro, árabe ou paulista
Amaro despertar do realista
Não carece de ser adoçado!


Quem quiser doce, que ligue a tv!
Sendo um cego, o que queres ver?
Na pequena chícara branca, uma dose de um líquido escuro
O café aqui meu amigo... É puro!


Vida longa ao Café Puro e a todas essas mentes camaradas, sedentas pelo que há de interessante. Aproveitemos até a última gota deste café!

clichês- Lígia Fernandes

Mar, amigos, sol.
Cores, degradê, natureza.
Tranquilidade, silêncio, eternidade.
O pôr-do-sol ali,
tão distante, mas tão perto.
Um acontecimento singular,
um momento único.

Aquele céu alaranjadamente magnífico.
Que a todos encanta,
que a todos imobiliza.

Clichê, clichê, clichê

- é tudo clichê [se segmentados].
Pois ao unirmo-os,
há uma imagem peculiar,
há uma imagem singular
- o pôr-do-sol.

terça-feira, 20 de julho de 2010

Aos olhos de Sartre- Nico Ascenção

Chego à estaca "zero"... parece que nesse espaço, que regem outras circuntâncias temporais, não consigo me mover dentre esses abismos decimais e centesimais que me separam do "um".
Pobre de mim, vivendo com um sabor amargo das experiências começadas e nunca concluídas, digo amargo porque sou ansioso e gostaria de ver o completo (o perfeito), poderia ser doce se eu analisasse com mais cuidado e percebesse que é neste salto arriscado e perigoso ao escuro do infinito que construímos uma vida.
Me descomprometi um pouco com o texto, para olhar o que havia do outro lado da janela, deixando que a luz esquálida de um dia nublado no Rio de Janeiro tocasse meu rosto. Lá na rua vi crianças batendo bola, mulheres conversando e um grupo de amigos boêmios sentados no bar bebendo, todos ingênuos esquecendo ou até mesmo sem saber que o tempo implacável age incessantemente sobre eles, pois o corpo como matéria perece! Tudo tem um fim se material for, para os vivos o fim tem um nome menos gentil... a morte.
Caindo nesse líquido viscoso que é o pensamento sobre o fim, me vi um pouco entristecido porque me apaixonei pela vida e pela oportunidade de agir que ela nos oferece. Mas logo sacudi meus pensamentos, remei para me apoiar nas bordas e me livrar desta natação indesejável e descobri uma solução lá no fundo que gostaria até de deixar como um conselho, que é atingir a imortalidade! Simples assim, continuando a se aventurar na tentativa de alcançar o Em-Si tendo a ciência de que nunca chegaremos lá!

vítima- Francisco Knulp

sou rejeitado...
oras, serei eu vítima do meu próprio vitimismo?
sou azarado...
oras, deverei eu desatribuir os erros dos homens errados?
sou burro...
oras, subestimo-me apenas para não superestimarem-me?
horas, como essas passam... e acabam comigo. acabam?

segunda-feira, 19 de julho de 2010

50! 50! 50! - sim meus amigos!

chegamos hoje ao quinquagésimo texto do blog ''café puro'' agradeço a todos os escritores e seguidores do blog pela maravilhosa ajuda prestada , e que venham a existir muitos outros cinquenta!

bacanais, festas e imbecis.- Rolando Vezzoni

uma porra duma câmera,
com um porra dum individuo.
filmando uma porrada de pessoas,
estas se comendo e copulando grotescamente,
sendo que nem ao menos assumem o ato.

nada é essa imagem além de um shopping,
ou de uma festa.
tudo uma encenação não declarada de uma orgia,
de um bacanal de imbecis, estes se desejam,
embora se desprezem profundamente, permanentemente.

ah! saúda essa cegueira que parece-lhe tão maravilhosa,
e imagina que, o louco seria os ver de fato, e não fantasiados...
dispersos em desejos agora declarados,
aparecendo os mais humanos...
e os incrivelmente inumanos dançando em sua suruba eterna.

(sem título)- Lígia Fernandes

Fui dormir e esqueci de trancar a porta.
A solidão entrou e levou tudo.
[vazio]

Mas deixou, no caminho,
cair algo.
Algo que, de tão inho,
nem notou.
[esperança]

A janela aberta,
a tristeza espera.

Fui atrás do que caira.
Uma foto,
uma foto dele.
Que, ao me agachar
para pegar,
o vento levou...

E levou a foto,
e levou a esperança.
E deixou o vazio,
e deixou a tristeza.

Mas levou a foto,
levou a esperança.

Os limites da minha felicidade (?)- anônimo

Mais uma vez aqui, estacionado nas mesmas condições medíocres de espírito, experiências de vida e felicidade, chego ao final de um livro. Não, ainda não o terminei, mas muito pouco resta a ser lido. Então o romance que este relata se encontra em seu clímax e é natural que a curiosidade me impulsione a ler mais; ler até que tudo se resolva, até a última página, a última frase, a última palavra que antecede o último ponto final- o único que de fato representa um fim.
Mas resisto a esse impulso, ou pelo menos tento resistir. Por que? Pois já passei por isso muitas e muitas vezes e sei que se começar a ler agora farei como já mencionado: não largarei o livro até que ele não tenha mais nada a me oferecer, e a fonte de felicidade que me supriu por esta semana estará escassa.

Por outro lado, sei, também por experiências anteriores, que acabarei alcançando aquele ponto final egoísta e maldoso em algum momento, por mais que eu o evite, e então me ocuparei em buscar outra leitura que abasteça minhas necessidades humanas de ser feliz, uma vez que (a já citada) pobreza de espírito e de experiências de vida me impede de encontrar felicidade menos superficial e incompleta. (Afinal, eu vivo na vida outros... será que isso faz sentido?)

Só há uma primeira leitura, que é superior a todas as outras quando se fala das emoções que ela provoca. E isso me preocupa. A magia de um livro nunca desaparece, ela pode ser resgatada a qualquer momento, mas mesmo que ela volte a me surpreender e a me emocionar, nunca o fará tão intensivamente quanto o fez sob o caráter imprevisível e independente da leitura- prima. Tenho tanto mais a lamentar, temer e refletir sobre o assunto... Todavia, não sei se já mencionei, mas um livro me aguarda, ou melhor, suplica para ser terminado. Logo ali, sobre a cama. E eu não posso deixá-lo esperando, não mais.

cheiro de saudade- Lígia Fernandes

Saudade disso, falta daquilo.
A infância, o tempo sem preocupações.

O cheirinho de chuva, de grama molhada,
da casa da vó, de tênis novo,
de pipoca doce, de vela apagada.

O barulho do pedal da bicicleta girando ao contrário,
da bola de borracha quicando no asfalto.

E ele, super herói tão alto,
em cima do armário,
a pular e voar pelo quarto.

(sem título)- Giovanna Palermo

Eu vi o ponteiro dos minutos
andar uma unidade pra trás
e foi nesse minuto que ganhei de vida
que escrevi um poema lento
em que um minuto, é um minuto demais.

segunda-feira, 12 de julho de 2010

Retrato de um menino-homem malfadado.- Francisco Knulp

A primeira rajada do vento frio não leva-lhe.
Tampouco a segunda, sendo essa mais forte.
Agora antes das próximas já se perguntava:
-quantas outras ainda virão?

Já a próxima, vinda de surpresa, levou-lhe
Esta que procedeu já nem do mesmo jeito, lembrava a morte.
E enquanto via-se derrubado, indagava:
-e agora, fodeu-se tudo então?

Agora este, que seria logo visto como cretino, levantou-se, e lutou por bravos e não breves momentos (estes não importam)... Nada tão demais, mas nem pouco como lhe foi retratado.

Caiu.
Caiu, não... Despencou.

Agora viu-se resolvido, abiu uma concha e lá enfiou-se o imbecil, que agora já não mostrou-se sorridente, pois sabe-se dele como um sujeito revoltado.

Este caiu novamente, sempre errado... Burro!

Agora a paisana, por incrível que pareça... É, e foi despencando que viu-se despertar, lembra-se de sua infância, embora agora de armadura e olhos abertos... Triste fazer dessa criança um homem. Ainda mais se adulto, esse não encontra-se liberto, tampouco, feliz.

(sem título)- Pedro Menezes

A tristeza nunca está sozinha e hoje veio me visitar. Chegou de surpresa, sem avisar. Já coloquei a vassoura atrás da porta para ver se ela não demora.

Eu digo pra ela ir embora, que sou forte, posso me virar. Mas ela não ouve. Fica ali, parada. E vai aonde eu vou. Até nos meus sonhos ela aparece. Por que veio? Vai visitar outra pessoa. Você tem tantos amigos.

Ela não tem amor próprio. Vive pelos cantos, sendo rejeitada por quase todo mundo. Ela não se importa. Sabe que vai embora mais cedo ou mais tarde.

Mas antes de visitar outra pessoa, ela faz questão de ouvir as músicas mais tristes, lembrar dos momentos mais nostálgicos, ler os trechos mais densos, assistir aos filmes mais pesados.

Não sei o que fazer para expulsá-la. Já bebi, já chorei, mas ela insiste em me acompanhar. Vive me fazendo olhar pra trás, colocando suas escamas em mim.

A tristeza é um vírus altamente contagioso, deixa todo mundo em volta pra baixo, de cama. Estou de quarentena, isolado, não quero passá-la pra ninguém. Porque hoje eu quero morrer com ela.

quarta-feira, 7 de julho de 2010

o ateu e a tia- Rolando Vezzoni


Havia uma tia jogando água benta nas pessoas na tal da paróquia(já digo agora, não que houvesse nenhuma necessidade de ele ter feito isso, antes deveria ter tomado seu vinho quente pelo-menos, embora fosse de todo divertido fazê-lo)... água benta essa que respingou-se por todo o rosto dele (ironicamente não se incomodou de inicio) e no instante em que percebeu que essas gotas de água eram bentas pulou e gritou satiricamente “ai! Isso queima! Parem!”, o que por alguns segundos lhe pareceu uma brincadeira muito legal (e a mim também caro leitor), até aquele momento em que percebeu que os homens benzidos não eram de bem, e estavam se aproximando satãnicamente.
Isso pouco antes do agora ( nesse momento indefinido e irrelevante torna-se atemporal) que lembro daquela imagem de credulice que havia visto antes do episódio relatado.
Meio de tarde, ainda sol, e com um céu particularmente azul com poucas nuvens, sendo que estas poucas tem aspecto ‘’fofo’’, e enquanto aproveitava para olhar as coisas na rua, enquanto a descia vi uma empregada domestica que trabalha em uma das casas, uma senhora de mais de cinqüenta anos e com aspecto de todo jovial.
-bom dia!
-bom dia!- respondeu com um sorriso no rosto, este eu respondi com outro sorriso.- é um belo dia esse que deus nos deu, ‘’né‘’?(eu aprendi a escrever “Ele” e “Deus” num colégio presbiteriano que estudei, embora sempre tenha me incomodado a literatura e a gramática sofrerem esse incômodo unilateral, portanto vetei esse formato em meus textos)
Penso até agora nisso, passam ela e tantas outras pessoas o dia agradecendo a algo ou alguém que não se tem certa a existência... Sendo ainda essa incerteza muito improvável, e não só isso, controversa.
-É! - tentei ser simpático, não ofende-la com minha vida de “pecador” ,“descrente”, etc...- se houver algo mesmo...
-LÒGICO que tem...- disse apoiando o queixo nas mãos que se acomodaram na ponta do cabo da vassoura, Se não tivesse deus agente não existiria! Não ia ver as pessoas que gostamos novamente!
-ah, verdade, desculpa... - com um sorriso simpático no rosto.
Não, não mudou meu ponto de vista, se é isso que pensa, mas eu não iria discutir a crença otimista daquela mulher, não existe um porque nisso, que ela morra acreditando que virá algo, é melhor para ela. MESMO.
Mas nesse tal de agora entendi melhor aquela tia que queria trazer o ‘’bem’’ e ‘’deus’’ para as pessoas... Não acredito nele, mas agora entendo... Ter-lo é acreditar que não haverá o fim e tampouco a saudade. Eu consigo respeitar isso, esse é um “ópio” que deve ser bom para uma vida... Mas o barato passou muito cedo em mim, ainda somos todos humanos.

(sem título)- Lígia Fernandes

Uma escuridão, um breu profundo. E cá estou retirando de meu entorno todo e qualquer tipo de distração. Aprendi que penso melhor no escuro, que as melhores idéias surgem na madrugada. Pois vêm a chuva de problemas e pancadas de sofrimentos. Bate a tristeza e, em seguida, aquela vontade momentânea insaciável de querer você. Simplesmente te ver. Ouvir tua voz, sentir teu cheiro. Pronto, passou. A tristeza voltou e veio junto um sentimento de solidão.

Me sinto tão só e está tão escuro. Estou eu, sentada no canto da cama apoiada na parede e coberta por uma manta, sozinha e iluminada pela luz da tela do note book. Nem que quisesse seria capaz de te ver, pois está escuro; queria poder sentí-lo, quero tocá-lo. E você pouco sabe isso... Queria que soubesse. Sinto um emaranhado na garganta, quero agora a claridade e enxergá-lo para poder contar-lhe esse meu desejo. Mas sou louca, não caia nessa! Nem nos conhecemos. Então façamos o seguinte: conheçamo-nos. Conversemos, troquemos idéias. Quero saber o que gosta e o que desgosta. Quero poder novamente sentir um abraço seu. Um abraço, mais um; que não seja o único muito menos o último.

Mas não era essa uma vontade momentânea? Talvez os momentos tenham se esticado porque ainda te quero.

Chega! Nada disso é certo. Uma paixão idealizada [totalmente] - passo o dia sentada em frente ao espelho imaginando como seria uma conversa com você. Isso não é certo, não é normal. Já disse que sou louca... Chega.

terça-feira, 6 de julho de 2010

torpor- Giovana Vilela

Olho para os dois lados: nenhum carro passando. Atravesso a rua correndo e entro em casa, sentindo o sangue percorrer entre as veias de todo o corpo. É como se tambores estivessem rufando dentro de mim, da cabeça aos pés. Sento na poltrona, não sem antes me segurar em suas bordas para evitar cair. Ainda consigo sentir a gota de suor que brota no colo do meu peito e vai apressada encontrar as tramas do tecido da blusa, desfazendo-se por lá. Olho para frente e não vejo nada senão a escuridão. O torpor na minha cabeça faz os pensamentos girarem, indo de lembranças do mês passado para os acontecimentos de hoje de manhã. Escuto vozes em meio dessa vertigem, só que vindas de fora, do patamar de cima. E só fazem gritar em meus ouvidos, juntas com um repetido toque que fica martelando insistentemente, transformando minha mente numa granada que acabou de perder seu pino, pronta para explodir. Mas o que me tira do sério, na verdade, são aqueles pensamentos que teimam voltar à tona. Como num filme, ouço risadas ou palavras entrecortadas por suspiros de impaciência. E sempre as mesmas imagens: trocas de olhares, ambos com as bochechas em fogo ou então os olhos da menina virando para cima, como que suplicando a si mesma para que acabe logo com essa paixão não-dita. Aliás, quando vou acabar com essa paixão não-dita?

segunda-feira, 5 de julho de 2010

A Legal e o Otário- João N. Valente

Aparentava ser uma mocinha recatada. Ainda na faculdade, uma privada de alto estilo, usava aquele perfume Giovanna Baby. Mas o cheiro que gostava mesmo era aquele que parecia com água sanitária. Estudou a vida toda nos melhores colégios, comportando-se como uma donzela pudica, casta. Ninguém nunca desconfiara não só de seus desejos, mas nem de suas ações.

Desde o colégio, gostava de postar-se à frente, carregar o livro do professor, procurava tirar as maiores notas e estudava até tarde no colégio. Mesmo em épocas festivas, não arredava o pé da instituição de ensino, afinal, criada em condomínio fechado, não tinha muita chance, enquanto adolescente, de dar suas escapadas. Mas lá encontrava os meios de aplacar o pulsar de seus anéis umedecidos.

Certa feita, sozinha, pois era um dia de copa do mundo, estava ela lá, e apenas o rapaz da limpeza. Fingia, a jovem, estudar biologia, e o cidadão a limpar o pátio em frente à área de estudos. Ela, então, que naquele calor só poderia estar de saia, flertou com pobre coitado que, perdido, desconsiderava a possibilidade de se tratar para ele a doce benfazeja abertura ventral; mas a moçoila, que com o lápis na boca, desligada do mundo, apenas balouçava a perna direita, sabia construir seu caminho e fazer com que os carneirinhos caminhassem por ele. Ainda mais esses, que lhe pareciam ter membro jumental.

Enfim, esse jovem faxineiro, foi apenas um daqueles que passaram pelos seus desejos. Ela não poderia deixar, todavia, que entrevissem esse seu furor vaginal, de modo que logo arrumou um namoradinho, um tolo, sonhador, um daqueles babacas apaixonados por livros e sonhos. Assim ela poderia enrolá-lo facilmente. E assim o fez. Saiu com professores, professoras, assistentes, seguranças.

Aos dezessete anos entrou na faculdade. Manteve o relacionamento com o jovem otário. Afinal, não podia perder a pose! Sua origem, sua família, seu condomínio!! Não se importava com dinheiro. Até lhe ofereceram dinheiro e bens, mas ela queria era sexo. Ela não se importava por objetos, a não ser por aqueles que poderia introduzir no seu âmago.

Cada vez mais, o ímpeto sexual lhe domava. E, assim como antes, agia por impulso, sem pensar. Mas agora sua voracidade fazia com que trepasse com dois, três homens; com homens e mulheres juntos. Certa feita, para que desse tesão a um homem por quem quase se apaixonou – sim, ela não se apaixonava, só tinha ímpetos... – amou uma malacatifa (que não era peçonhenta).

Hoje, ela continua feliz. Prossegue no uso de seu otário. Este nunca descobriu, mas é feliz. Até hoje a ama. Só não entende por que ela não quer ter filhos. Trabalha oito horas num escritório e procura tratá-la com respeito, amor e afeto. Mas nunca, jamais!, tentou comer-lhe o cú.

domingo, 4 de julho de 2010

O pretérito do preterido- Anônimo

Reli o que a ela escrevi...


Não é possível que escrevi algo errado.
Não é possível que ela não tenha gostado.


O fato é que gostei e foi sincero.
Saiu do meu íntimo.
Se não atendeu aos seus anseios,
que pena. Adeus.


É tão triste quando se faz algo pensando
ser o belo para alguém e acaba sendo
algo triste, dissaboroso
- ou quiçá asqueroso?


Não posso julgar por ela.
Posso, apenas, por mim.


E por mim foi de coração.
Sincero, com amor, com carinho.


Meus limites literários circunscreveram apenas a exterioridade do que senti.


Pena aparecer agora o verbo no pretérito.
Pior mesmo é estar no pretérito perfeito.
Em breve estará no mais-que-perfeito.
Só isso, então, terá sido mais que perfeito entre nós.
O pretérito.