segunda-feira, 4 de fevereiro de 2013

Barata tomando coca-cola- Rolando Vezzoni

   Parado na parada de ônibus, fazendo nada no meio do nada, humanos mandam bem nisso.
   Nenhum puto no bolso, só um pedaço retangular de plástico (que não vale um centavo quando se está a vinte minutos da borda do planeta) e uma garrafa de coca-cola quente (ácido sulfúrico).
   Fora parar por ali por ter dormido no ônibus anterior, rumo ao lar, mas a noite mal dormida havia massacrado todas as chances, e um homem mal dormido é apenas um dezoito-avos de homem, uma miniatura caminhando pelo mundículo povoado de homúnculos com problemículos muito menores do que ficar preso num ponto de ônibus a esquerda da puta-que-o-pariu.
   Depois de algumas horas sem movimentações interessantes, começou a andar em círculos, círculos que se desenvolveram em um circuito elaboradíssimo, que se estendia até o arbusto amarelo que tinha folhas meio ovais, pessoas tem circuitos: é preciso seguir caminhos para ser uma pessoa.
   Também era sujeito de evitar movimentos desnecessários, sempre foi sujeito de evitar muitas coisas e analisar situações, e foi depois da décima quenta volta que se deu conta do maravilhoso paradoxo que era ficar preso num local em que se usa para dar um jeito de ir embora.
   Na noite caída a paz reinava, a noite na parada quem dorme é o leão...
   Noite sem um teto é covardia universal... O homem constrói tetos por saber que as vezes o crânio não é o suficiente para se guardar o corpo, e guardar o corpo é uma tarefa trabalhosa.
   Monologar reclamações na madrugada solitária foi a solução, organizou suas reclamações por ordem alfabética: Um homem não é homem sem alfabeto.
   A manhã é gloriosa, sol nascendo com preguiça, e o primata pelado e suado, sentado de camisa depois de vinte e tantas horas preso sem banho (e o banho é importante, salvo no caso dos franceses.) admirando o sol, que brilha mais forte na esquina da casa-do-caralho.
   Pra lá pra meio dia que tomou a coca-cola quente, coisa que como homem jamais faria.
Sempre sentiu medo de ficar preso, e ficou preso num lugar aberto de onde deveriam ir e voltar pessoas. 
   Preso pelo medo de perder sua liberdade, no cu-do-mundo depois do arbusto amarelo de folhas ovais, sozinho tendo a plena consciência de que não há consciência a ser compartilhada quando se está sozinho.
   Os humanos precisam de humanos... Era uma barata tomando coca-cola no ponto final.

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