segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

Especial de dezembro parte 1: Rolando Vezzoni e a última noite do planeta azul


“Você sabe o que vem hoje, né?”
“Não”
“O mundo acaba”
“Num começa com neurose”
Ela levanta, segue até a frente da televisão.
“Eu tava te devendo um strip.”
“oohhh, isso é interessante, nunca ganhei isso antes”
“nem eu fiz”
“então vamos fazer direito”
Ele caminha, pega umas cervejas, despeja numa jarra e pega o copo e o cinzeiro.
“não, quero você de camisa, gravata e cueca”
“por quê?”
“quer que o mundo acabe sem nunca ter ganho um strip? tem que contextualizar”
“ok”
Gravata, camisa, e uma cueca? Que cueca? Cueca do Snoopy, de natal com o Woodstock de Noel, um brinde a dezembro.
Volta, só uma luz de fundo acesa, clima bom, tocava Bee-gees.
“poxa, Bee-gees não, fica gay assim... muda isso”
Risos, sempre difícil manter a seriedade, mas isso é bom, pessoas sérias não são companhias ideais para o fim.
“o que então?”
“jazz, pra ornar com a meia calça, que tal um sapato?”
“só tenho tênis”
“desencana, você ta linda”
“é mais fácil assim, né?”
“como?”
“você só elogia na iminência do fim do mundo... parece que tem medo”
“eu não tenho medo do fim do mundo, não faz muita diferença”
“não é do fim do mundo que eu to falando”
Silêncio e sorriso safado, melhor não discutir a vida quando se está vivendo.
Jazz, andar lento, abrir latinha, acender cigarro, cara de bobo. Todo homem tem que fazer cara de bobo na hora do strip.
“Abaixa a mão, não pode tocar, ordens da casa!”
“do que você ta falando?”
“entra no jogo”
“ok”
Puxa a gravata, faz cara sexy e se afasta, ele tenta continuar sério, ela tropeça um pouco no ritmo, tudo bem, falta de perícia é charme.
“então, como é o seu nome?”
“não posso falar, ordens da casa... me chama de Vênus”
“se atendo aos clássicos”
Fez tudo parecer mais real, a verdade é que sempre foi tudo clandestino por ali, sexo e amizade na ilegalidade, fuga da moral alheia... Finalmente era um clandestino digno do apocalipse.
“Do que você gosta Srta Vênus?”
“Gosto que puxe o cabelo, e de tapa, mas devagar”
“Bacana isso”
“Continua fumando, é sexy”
“Sem problemas...”
Sutiã que abre na frente, preto contra a pele clara, óculos escuros para mamilos rosinhas.
Rasga a camisa, morde o pescoço fraquinho.
“isso é psicótico”
“fica quieto aí”
“ok”
“do que você gosta?”
“peitos, e que arranhe as costas”
“só?”
“eu logo penso em mais alguma coisa, por enquanto tudo certo”
Pele, suor, dezembro é quente, os ameríndios sabiam.
“pensa rápido, você tem mais algumas horas de vida”
“até lá, já quero gasto umas 2000 calorias, para fumar meu ultimo cigarro”
“Porque não acabar o mundo num orgasmo?”
“O importante, é já ter gozado a vida, e ter alguns minutos, só para poder lembrar”
“lembrar do que?”
“ De morrer vivendo e de viver morrendo... ”
“Hãn?”
“Que o fim não é o objetivo do meio, por isso a mulher, não minha mão. ”
“é tudo troca, empatia “
 “se já teve isso, tudo bem, que venham os titãs, Srta Vênus “
Olha de baixo, belas sobrancelhas.
Fricção, movimento, lábios, mulher, homem, orelha, unhas, sede, saliva, cevada, pausa, giro, simbiose, agora troca, vai pra baixo, escapou, voltou, risos, muitos risos, cai jarra, é um banho gelado, está tudo valendo, respiração, aceleração, calma, descanso, fim de uma, calma, fim do outro...
Isqueiro, teto, fogo, cinza e bagunça... Seria o sexo, um amor sem guerra?
Tudo vale na última noite do planeta azul. 

Um comentário:

  1. cara, gostei muito da prosa, o ritmo é incrível e... que venha o fim do mundo (como a gente o conhecia).
    Filipe

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