sábado, 15 de outubro de 2011

Minha amiga .38- Bruno Santana

Todos os dias, antes de dormir, dou brilho na minha .38. Ela é minha melhor amiga, me aguenta todo o dia, ouve sem reclamar, reclama
quase nada, fala com parcimônia e tem poder suficiente pra me dar a dose exata de medo.
Minha amiga é inteligentérrima, feita de madeira e aço; com espaço para carregar o tanto de chumbo que eu quiser. Isso sem falar
da sua capacidade de disparar estórias; minha amiga dispara estórias como ninguém!

O problema é que suas estórias são sempre um tanto quanto trágicas e machucam.
Acho que é coisa da família dela, eles guardam muitos esqueletos no armário; ela nunca me disse isso, obviamente,
mas é fácil concluir.
Ela sempre me fala sobre quando seus avós vieram pra América, como encontraram uma terra linda, uma civilização próspera, tecnologia
avançada, essas coisas ...
Infelizmente, os patrões deles não pensavam o mesmo e seus avós trabalharam na destruição daquilo.
Ela diz que é por culpa deles que a América é o que ela é hoje.
Juro que não sei se ela é irônica quando diz isso. É difícil entender, a voz dela é grave. Acho seu único traço não feminino.


Para ser honesto eu não gosto quando ela fala de história, ela sempre se emociona e é difícil ver um trabuco daqueles chorando,
é triste e perigoso.

Gostar eu gosto mesmo quando ela começa a falar sobre o sentido das coisas. Um amor! Se refere à isso como "falar de peixes com
peixes". Conhece toda a filosofia que interessa!
Sempre fica me conta a história de velhos barbudos e suas teoria malucas;
gastamos horas nisso!
A última dela foi me falar sobre os cientistas ingleses; uma raça de homens viciados em chá, verdade e provar que Deus não existe.

Isso sem falar dos amigos. O círculo de amizades dela é, pelo menos, dez vezes mais impressionate que ela própria.
Só nesse último mês eu conheci os ingleses doidões do chá, um médico alemão tarado pela mãe [vê se isso pode!], um poeta americano
bêbado tarado [também] e uma poetisa americana viciada em morrer.

Essa poetisa, preciso confessar, fiquei apaixonado. No entanto, resolvi não contar isso para a minha amiga
... vai que ela é ciumenta?
Eu nunca estragaria uma amizade dessas!

Ahhh, minha amiga, você precisa ver como ela é feliz quando fala comigo!
O sorriso de orelha à orelha naquele perfil metálico polido!

Sabe, ela é o tipo de pessoa que pode te convencer de qualquer coisa. Meus outros amigos e família dizem que por isso mesmo ela é
perigosa. Pra mim é dor de cotovelo,
... tem muito tempo que ela é a única que fala comigo.

Poxa, que loucura!


Dizer que minha amiga é perigosa. Não! Não! Eu não acredito nisso!
Ela não é perigosa! Se Fosse, não dormiria todos os dias com a boca virada para mim.
Não é verdade?



me diz, não é verdade?

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