quinta-feira, 14 de fevereiro de 2013

Os mosquitos bebem de graça- Rolando Vezzoni




Penso que era carnaval (ao menos parecia), a xícara tinha gosto de barulho, acho que estava certo.
O bule cheio esfriando e a luz forte e sozinha das oito horas, que é o horário reservado para quem quer ficar sozinho tomando café quase frio ("quase" por estar um calor do cacete).
Acho que era carnaval, o cigarro tinha gosto de bagunça, tinha de estar certo.
Os confetes na grama úmida refletindo a luz de fim de verão, cuja a função é te lembrar que não descansou e dormiu como deveria nos últimos feriados e dias "inúteis" de sua vida.
Sei que era carnaval, o pão tinha gosto de noitada, estou certo disso.
As pessoas acordando confusas são muito mais interessantes, o cheiro de ontem e os mosquitos caranguejando por terem chapado do sangue alheio... Invejável.
Barulho, bagunça e noitada correm soltos na terra de Macunaíma, e não tenho tempo a perder.
Saio a caça de algo para chamar de carnaval.
Olho o boteco e o céu, já sei como termina:
Comigo rachando aguardente pra ralar e rolar com Iracema, que pra ser índia só falta tirar a calcinha...
Barulho, bagunça e noitada são folia em terra de mosquito que tem tempo pra beber.
Ando com preguiça e mãos dadas, o mundo corre e eu flerto, sou um corpo cosa-nostra de espírito tupiniquim.
Os homens bons lutam pelo canto mais macio da guia, homens bons precisam dormir.
Só escritores deixam de ser artistas nos carnavais, somos netos de Baco e Vênus, deuses fugidos do inverno europeu...Caçadores de caipirinha.
Bocejo entre o beiço e o pescoço duma ninfa tão embriagada quanto eu, embalados num calor que foge ao bom censo.
Barulho bagunça e noitada são a graça no trajeto ao lar do artista falador, e já nem sei que tempo é.
São três latas e três horas da manhã no lençol que nos recebe, onde não se tem nome nem ano.
Em extase o universo encolhe, e só há o cômodo e o que, de minha perspectiva é observado:
Mulher, mosquito e cigarro... Como se diz suor em tupi?
Sim, era carnaval, a noite tinha gosto de futuro, e tudo que queria era uma boa soneca e um café quase frio pela manhã.

Nenhum comentário:

Postar um comentário