terça-feira, 7 de dezembro de 2010

Apenas uma evolução foi ininterrupta?- Rolando Vezzoni

     Eles jamais haviam pensado que em algum ponto de suas vidas, estariam tão iguais e estáticos, e talvez, se olhassem mais atentamente seus espelhos, perceberiam também que outros que já um dia foram tanto diferentes por maturidade, se aproximaram como que em uma onda forte de ''psicose camaleônica retrocessiva'', culminando para uma solução praticamente monofásica, que tende a tornar os conviventes cada vez mais nivelados, sem divergências consideráveis ou importantes no todo.
     Sem um alguém que lhes lembrassem do quão irrelevantes se sentiam, eram, continuariam a ser, de onde iniciou-se a caminhada ou pior, onde esta caminhada terminaria, sem esse alguém lhes atrapalhando no processo de esquecimento condicionado, perdiam mais e mais esses tão repudiados pensamentos, o que lhes permitiu uma lógica mais confortável, que para um ser humano mais saudável pareceria um tanto quanto estúpida, e assim com o tempo aprenderam a conviver com esse cume de inconsciência e conforto social.
      Com o tempo passando porém, era de todo inevitável que esses formidáveis ratos cegos deixassem de tatear o mundo e as coisas da mesma forma e maneira, ainda, por mais que tentassem, as velhas e estáticas lógicas de existência iam se mostrando falhas em aspectos importantes para um ressonante mais qualificado e com um interesse destacado por razões ainda não explicadas.
     O indivíduo agora mais crítico e preparado inicia com procuras pessoais um triste processo, que começa já com, a principio leves marginalizações, ridicularizações e descaracterizações sistemáticas talvez inconscientes dos residentes de seu meio de convívio, e quando uma vez iniciado o processo é de improvável regresso, e já logo percebe-se que é quase certo o conflito no caminho futuro desse agora aventureiro desbravador de si próprio.
     Esse processo leva o indivíduo para uma dolorosa metamorfose digna de Kafka, tão trágica e ao mesmo tão satírica quanto um burro senador de Nero, que provido de falso poder e perceptível vantagem aos demais, sente a dor e o peso da exclusão e do medo, aos poucos percebendo-se um eterno alienígena social preso a suas divagações e opiniões dolorosamente divergentes das de tantos outros, e por mais que possivelmente irrelevantes lhe causam incômodos semelhantes aos de uma carapuça apertada que a muito deixou de servi-lo e passou apenas a apertar-lhe constantemente as têmporas com o provável intuito de impedi-lo de ser algo mais.
    O agora observado processo, quase transmutado numa síndrome (o que seria, se não tão trágica e de possível controle), que já a principio dilacera o portador. Seus membros aos poucos se tornam mais rijos e doloridos, seu crânio pressiona seu cérebro e seus olhos crescem ao compasso em que sua coluna torna-se dolorida, seu sorriso inexpressivo e sua voz rouca, a forma física muda, quanto mais mudada, mais sóbria e dominada pela verdade que vai tomando-o como um câncer se espalhando por cada centímetro da breve limitação do animal, que cada dia mais sente seus órgãos vitais extrapolarem os limites da pele, deformando-o em algo novo, bem menos harmonioso e ainda mais indigno de carinho ou afeto, essa criatura que se forma grotesca a cada momento mais questionada e solitária passa a entender as minuciosidades da existência inexplorada que agora dispõem, um tanto quanto distante do mundo antes conhecido, que agora nota-se mais extenso e cruel.
    Esse reforma homérica, atualmente se comportando mundialmente como atemporal, sem estopim específico em idade alguma, sem de fato momento para se iniciar, sem garantia de sua participação na vida de muitos indivíduos e de incerto fim foi se completando na pobre aberração, que ia pouco a pouco se tornando o monstro que tanto lhe parecia distante a pouco, e que se orgulha de haver-se tornado, um adulto.

Um comentário:

  1. Conflitos e questionamentos são indigestos, mas, pior seria o conformismo, adotado às cegas, pensar é condição de liberdade.

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