quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

A vela- Rolando Vezzoni

Agora eu fugia, fugia da fuga, que era pouco antes, importante, tanto quanto um remédio necessário, mais que necessário.
Entrei quase destruindo a porta da casa, esta, em abandono extremo.
Por fora carcomida pelo vandalismo e podridão, por dentro era pior.
Era Tudo tão escuro.
Procurei o conforto, mas minha droga me afastava.
Sondando pela casa logo vi uma vela que naquela escuridão brilhava fraca num candelabro torto.
Andei cautelosamente atrás de seu calor.
Me aproximando, percebi algo nas sombras, um rosto com olhos enormes carregados de olheiras maiores ainda, uma boca lotada de dentes e escárnio com a palidez de quem sabe apenas temer.
o tempo parou.
...
Odiei aquilo que via, fedia a morte.
Enlouqueci.
Precisava me livrar daquela fera.
Urrei. Corri. Abati.
...
Tudo se desmaterializou, e pedras brilhantes choveram sobre meu pé.
O que vira a pouco era meu reflexo, num espelho tão sujo que me escapou qualquer semelhança,
e agora, lá eu jazia, no chão, quebrado como um quebra-cabeça incompleto, e sujo de sangue.
Tentei me reconstruir, mas a vela apagou furtivamente.
...
Eu me encontrei perdido.
Não há mais luz, nem esperança.

2 comentários:

  1. Mário de Sá Carneiro(amigo de Fernando Pessoa, poeta português):
    "...Tombei

    E fico só sobre mim"
    Trecho de Queda
    Ou o próprio Fernando Pessoa(como Álvaro):
    "A minha alma partiu-se como um vaso vazio.
    Caiu pela escada excessivamente abaixo.
    Caiu das mãos da criada descuidada.
    Caiu, fez-se em mais pedaços do que havia loiça no vaso."
    1ª estrofe de "Apontamento".
    De qualquer forma, vale o estilo, relembra tanto os dois poetas, grandes representantes do niilismo de uma época que acho não ser muito diferente dessa(ou de qualquer outra), quanto Poe, ainda assim, cuidado. O estilo é bom, como já disse, mas falta trabalhar o texto, quando li senti que faltava algo. Cuidado também com as simbologias, ás vezes sedutoras demais que acabam por se tornar o fim e não um meio. Ainda assim, não me entenda mal, é bom, poderia até dizer ótimo, mas é exatamente o tipo de texto em que se pode ver que podia ser ainda melhor. Interessante a questão da prosa-poesia, usada na minha opinião com naturalidade, não como um elemento vulgar à procura de alguma novidade e sim um meio de expressão.

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  2. dei uma mudada, da uma olhada e me diz se melhorou. alias, eu gostei das comparaçoes!

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