tag:blogger.com,1999:blog-50225879519312086542024-03-08T08:07:57.703-03:00Café puroartigo quinto, parágrafo IX - é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença;vezzonihttp://www.blogger.com/profile/06081816306861771433noreply@blogger.comBlogger213125tag:blogger.com,1999:blog-5022587951931208654.post-83164886113278324312013-02-28T21:33:00.001-03:002013-02-28T21:33:09.552-03:00A borra do café- Rolando VezzoniEsse é o ultimo post do Café puro.<br />
Após muitas considerações a equipe chegou a conclusão que boas coisas tem inicio, maturação e fim... por hora, o logo Café puro existe como ideia e história, não mais como a revista virtual.<br />
Por sempre ter sido um site de literatura, pouco mais falarei, e o encerro com um poema(não haveria outro modo):<br />
<br />
<br />
Bom, como diria Zé Ninguém (que Zeus o tenha)<br />
"o meio é muito mais louco que o fim"<br />
<br />
A xícara é entornada.<br />
Cada gole é o que foi:<br />um gole.<br />
<br />
-Prazer, meu nome é café:<br />
Quente.<br />
Amargo.<br />
Puro.<br />
Negro.<br />
Apreciável e finito...<br />
Como a vida, mas sem ressaca.<br />
<br />
(desejo o que quer que seja a quem quer que seja)<br />
<br />
Tudo que fizemos foi contar "estórias", e um post-post aqui e ali.<br />
Um brinde! e dois adendos:<br />
<br />
Rolando, sem metafísica, (cafalírico):<br />"faz parte"<br />Brunão, de Lins (ogro literário):<br />"é a morte do café, vou fumar um cigarro"<br />
<br />
Isso é tudo pessoal.<br />
<br />vezzonihttp://www.blogger.com/profile/06081816306861771433noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-5022587951931208654.post-73714413160299813652013-02-14T11:40:00.002-02:002013-02-15T14:49:16.314-02:00Os mosquitos bebem de graça- Rolando Vezzoni<br />
<br />
<br />
Penso que era carnaval (ao menos parecia), a xícara tinha gosto de barulho, acho que estava certo.<br />
O bule cheio esfriando e a luz forte e sozinha das oito horas, que é o horário reservado para quem quer ficar sozinho tomando café quase frio ("quase" por estar um calor do cacete).<br />
Acho que era carnaval, o cigarro tinha gosto de bagunça, tinha de estar certo.<br />
Os confetes na grama úmida refletindo a luz de fim de verão, cuja a função é te lembrar que não descansou e dormiu como deveria nos últimos feriados e dias "inúteis" de sua vida.<br />
Sei que era carnaval, o pão tinha gosto de noitada, estou certo disso.<br />
As pessoas acordando confusas são muito mais interessantes, o cheiro de ontem e os mosquitos caranguejando por terem chapado do sangue alheio... Invejável.<br />
Barulho, bagunça e noitada correm soltos na terra de Macunaíma, e não tenho tempo a perder.<br />
Saio a caça de algo para chamar de carnaval.<br />
Olho o boteco e o céu, já sei como termina:<br />
Comigo rachando aguardente pra ralar e rolar com Iracema, que pra ser índia só falta tirar a calcinha...<br />
Barulho, bagunça e noitada são folia em terra de mosquito que tem tempo pra beber.<br />
Ando com preguiça e mãos dadas, o mundo corre e eu flerto, sou um corpo cosa-nostra de espírito tupiniquim.<br />
Os homens bons lutam pelo canto mais macio da guia, homens bons precisam dormir.<br />
Só escritores deixam de ser artistas nos carnavais, somos netos de Baco e Vênus, deuses fugidos do inverno europeu...Caçadores de caipirinha.<br />
Bocejo entre o beiço e o pescoço duma ninfa tão embriagada quanto eu, embalados num calor que foge ao bom censo.<br />
Barulho bagunça e noitada são a graça no trajeto ao lar do artista falador, e já nem sei que tempo é.<br />
São três latas e três horas da manhã no lençol que nos recebe, onde não se tem nome nem ano.<br />
Em extase o universo encolhe, e só há o cômodo e o que, de minha perspectiva é observado:<br />
Mulher, mosquito e cigarro... Como se diz suor em tupi?<br />
Sim, era carnaval, a noite tinha gosto de futuro, e tudo que queria era uma boa soneca e um café quase frio pela manhã.vezzonihttp://www.blogger.com/profile/06081816306861771433noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5022587951931208654.post-46280511556204945442013-02-06T23:37:00.000-02:002013-02-07T00:19:23.267-02:00Papiro acidentado- Rolando VezzoniRabisca o papel, delicadas linhas,<br />se projeta olhos, olhos fortes.<br />Feição de menina e pele clarinha,<br />branca como o papel que a tem.<br />Desce para o pescocinho o grafite platônico,<br />depois volta e redesenha um sorriso irônico.<br />Mamas venusianas com movimento nulo,<br />proporções ventruvianas para o sonho repensado.<br />Repensado pelo homem que pinta, que deseja...<br />O ilusionista bidimensional de traço arrojado<br />ilustra a mulher objetivamente perfeita,<br />mas sofre pela triste realizãção:<br />As moças que realmente lhe apetecem<br />são subjetivamente imperfeitas...<br />E as tem em partes, e as deseja todas.<br />O problema da fêmea exata, é a imortalidade.<br />De pele e cheiro é o tesão do artista,<br />e para arte, tesão é o mais puro amor.vezzonihttp://www.blogger.com/profile/06081816306861771433noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5022587951931208654.post-38745075320310701722013-02-04T22:51:00.002-02:002013-02-04T22:59:34.736-02:00Barata tomando coca-cola- Rolando Vezzoni<div>
Parado na parada de ônibus, fazendo nada no meio do nada, humanos mandam bem nisso.</div>
<div>
Nenhum puto no bolso, só um pedaço retangular de plástico (que não vale um centavo quando se está a vinte minutos da borda do planeta) e uma garrafa de coca-cola quente (ácido sulfúrico).</div>
<div>
Fora parar por ali por ter dormido no ônibus anterior, rumo ao lar, mas a noite mal dormida havia massacrado todas as chances, e um homem mal dormido é apenas um dezoito-avos de homem, uma miniatura caminhando pelo mundículo povoado de homúnculos com problemículos muito menores do que ficar preso num ponto de ônibus a esquerda da puta-que-o-pariu.</div>
<div>
Depois de algumas horas sem movimentações interessantes, começou a andar em círculos, círculos que se desenvolveram em um circuito elaboradíssimo, que se estendia até o arbusto amarelo que tinha folhas meio ovais, pessoas tem circuitos: é preciso seguir caminhos para ser uma pessoa.</div>
<div>
Também era sujeito de evitar movimentos desnecessários, sempre foi sujeito de evitar muitas coisas e analisar situações, e foi depois da décima quenta volta que se deu conta do maravilhoso paradoxo que era ficar preso num local em que se usa para dar um jeito de ir embora.</div>
<div>
Na noite caída a paz reinava, a noite na parada quem dorme é o leão...</div>
<div>
Noite sem um teto é covardia universal... O homem constrói tetos por saber que as vezes o crânio não é o suficiente para se guardar o corpo, e guardar o corpo é uma tarefa trabalhosa.</div>
<div>
Monologar reclamações na madrugada solitária foi a solução, organizou suas reclamações por ordem alfabética: Um homem não é homem sem alfabeto.</div>
<div>
A manhã é gloriosa, sol nascendo com preguiça, e o primata pelado e suado, sentado de camisa depois de vinte e tantas horas preso sem banho (e o banho é importante, salvo no caso dos franceses.) admirando o sol, que brilha mais forte na esquina da casa-do-caralho.</div>
<div>
Pra lá pra meio dia que tomou a coca-cola quente, coisa que como homem jamais faria.</div>
<div>
Sempre sentiu medo de ficar preso, e ficou preso num lugar aberto de onde deveriam ir e voltar pessoas. </div>
<div>
Preso pelo medo de perder sua liberdade, no cu-do-mundo depois do arbusto amarelo de folhas ovais, sozinho tendo a plena consciência de que não há consciência a ser compartilhada quando se está sozinho.</div>
<div>
Os humanos precisam de humanos... Era uma barata tomando coca-cola no ponto final.</div>
vezzonihttp://www.blogger.com/profile/06081816306861771433noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5022587951931208654.post-31034084018624564202012-12-26T00:16:00.001-02:002012-12-26T00:16:10.060-02:00O afogando da piscina vazia -Rolando VezzoniMergulha de cabeça na piscina, pois não haveria outro jeito.<br />A água é rasa, mais rasa do que deveria ser quando se pula de cabeça.<br />O crânio nunca é o bastante nessas horas, e é hora de sair e tudo dói e gira sangrando o crânio... <br />Sobreviver é algo relativamente comum, mas feridas e cicatrizes são inevitáveis, e vai se lembrando disso conforme deita no gramado do jardim vazio, após sair do buraco, esperando alguém aparecer para lhe prestar socorro.<br />Mergulha de cabeça no delírio pós-traumático.<br />Está agora em uma calçada, sabendo que sonha, é sonho pois não há nada que segue a ultima gota vermelha, e cabeça dói como a sua real deve estar doendo no mundo desperto.<br />É uma rua, avenida ou algo do tipo, das bem grandes, e lotada de pessoas indo e vindo, tudo muito normal como deveria ser, até que começa andar e se percebe preso a uma esfera de ferro por uma corrente, move-se devagar pelo peso daquilo, como um preso de filmes antigos ou desenhos do Pernalonga.<br />-Ei! Tem uma porra presa na minha perna!- exclama na procura inútil de atenção.<br />Os outros olham com desconcerto e prosseguem andando num ritmo anormal e desconfortável, simplesmente se esforçando para continuar.<br />Todos estavam acorrentados.<br />Vai andando, é o jeito, se contextualizar naquela tão real irrealidade.<br />-Ei! Você!- lá de trás.<br />-Eu? -virando-se<br />-Tu! Não "ele" -diz uma réplica sua.<br />-Nós?<br />-Vós! Sua voz! é igual a minha, como a sua cara e o resto! Somos você!<br />-E eles?<br />-Não! Mas sim... Tudo ideia sua!<br />-Como assim?<br />-Estamos na sua cabeça gotejante!<br />-Já desisti de ficar confuso a respeito disso...<br />-Beleza!<br />Começam a caminhar sentindo o peso irritante, eles não, ele,seu sósia não carregava peso algum, era o único não acorrentado.<br />-Tem alguma mensagem que você vai me passar, o sentido da vida ou algo do tipo?<br />-Você anda vendo muito filme, não?<br />-Sei lá... Aí teria alguma utilidade, mas não existe isso.<br />-Nada é útil.<br />-E pra onde vai essa rua aqui?<br />-Pra nenhum lugar, só vai indo sem sentido.<br />-Isso me incomoda.<br />-A mim não, sempre gostei, desde criança.<br />-Como?<br />-Ora, não é assim a vida?<br />Concorda em silêncio, afinal, sim, a vida é assim.<br />-E você é o único não acorrentado a esse peso por alguma razão?<br />-Bom... Eu não sou vivo, sou apenas um ideia sua, com a simples função de...<br />-Passar o tempo?<br />-É!<br />-E os outros, eles também são ideias, e carregam o peso.<br />-Mas são ideias vivas, projeções de um conjunto de pessoas reais.<br />-Quando idéias vivem?<br />-Nunca vivem, mas sempre ilustram a vida...-Respira fundo- Ei!<br />-Que foi?<br />-Abraço!<br />As luzes mudam, está tudo voltando, há pessoas envolta e tudo certo, não vai acontecer nada, nenhuma lesão dizem os doutores, acordou socorrido.<br />
Grande piada a sua sr. doutor... Tudo deixa lesão, a vida é vida por lesionar, a unica coisa que não lesa é a morte, nosso vetor paralelo que nos ensina a gozar viver.vezzonihttp://www.blogger.com/profile/06081816306861771433noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5022587951931208654.post-46028301399374765072012-12-17T02:35:00.002-02:002012-12-17T02:35:50.675-02:00Nem perca seu tempo- Rolando Vezzoni<br />
<div class="MsoNormal">
Chuva de noite é sacanagem mas de manhã é redenção, é o
universo te mandando um respaldo legal para ficar em casa sentindo pena de si mesmo.<br />
Esôfago ácido, água e pão seco com muito queijo, preguiça de cortar com a faca,
rasga o pão se esforçando para fazer um sanduíche de merda, deita no sofá e
procura algo para assistir na tevê, algo que seja minimamente suportável.<br />
Nada, claro que não, tudo é assim numa manhã dessas, onde a chuva despenca em
gotas grandes, até o céu tem preguiça de ficar de pé.<br />
Ontem foi aquilo tudo, foi sair do trabalho puto, depois de meia hora lá, e a
certeza de ser despedido que até o agradava. <br />Fingir ser responsável é muito
cansativo e te faz realmente responsável aos poucos, e isso é perigoso.<br />Os anos antigos tinham charme, o porre era de qualquer bebida
e sem ressaca, o esforço para qualquer coisa era pequeno e celebrável, as
mulheres eram mais escassas mas nem se ligava disso, afinal, o mínimo era
mais charmoso, o mínimo era o máximo.<br />
Estava assistindo a estática da televisão, vários pontos cinza e barulho de
chuva em telha quando sua mente veio a tona querendo papear.<br />
“Pra quê tudo isso?”<br />“É que tudo tinha mais charme, tava pensando nisso agora”<br />“Eu sei né! mas... por quê assistir tevê fora do ar?”<br />
“Sei lá, acho que me lembra de quando era pivete e assistia a lareira enquanto os adultos falavam de política e assistiam ao jornal... Sem
influência nenhuma em nada, só se fala desse tipo de coisa para se sentir importante,
muito gente vive disso, e eles se sentiam importantes, mas eu sabia que o fogo
era muito mais intenso”<br />
“Você é escapista, estático com a estática.”<br />
“É melhor ficar de boa, Srta Mente, se não vou buscar meu uísque e te botar no sub”<br />
Se lembrou daquela cena, do James Dean, etílico brincando com um macaco de
brinquedo no meio da rua, levando ele no bolso do paletó para a delegacia
esperando erro, mas esperando tranqüilo.<br />
“Sabe, você me atormenta, me atrapalha na hora errada.”<br />
“Nem vem com essa, eu sou você porra, cê manja isso né?”<br />
“É, mas desde o Pinóquio a consciência tem a fama de ajudar... Você não, só me tira do prumo"<br />
“Ei, eu sou um abstração sua, você que observa as coisas assim, eu só te lembro
disso!<br />
Se você tivesse alguma moral, eu te
lembrava dela... mas como não tem, eu te lembro de não ter... se você olhasse
para o futuro, eu te lembraria dele, mas você vive de agora, e eu só posso te
lembrar que amanhã não vai lá hoje... só rindo mesmo.”<br />
“ótimo, minha mente ri”<br />
“Vai ver é o verão, é verão no mundo á sul do equador”<br />
“Que isso! Eu sei que dá pra ser infeliz no primeiro mundo.”<br />
“Infeliz é uma palavra forte”<br />
“É nada, é uma palavra fraca, negação de um estado idealizado, pelo menos
como se usa no geral, oposição arbitrária”<br />
“há! Ta vendo como não sou eu o problema?”<br />
“ok ok...”<br />
“Faz o seguinte: acha um filme bacana e liga pra alguma mulher, é isso que deve
ser feito, é isso que você faz de qualquer forma”<br />
Pensou nisso, pegou o celular para procurar o numero, mas foi interceptado pela
empresa anunciando que entendia seu problema, e que poderia voltar no dia
seguinte com desconto dos dias, como havia sido sua primeira falha.<br />
O sistema é absoluto, o sistema é inevitável, é disfuncional o suficiente para
funcionar e acabou... Nem leia isso, volte ao trabalho. </div>
<div class="MsoNormal">
Sério, você não pode perder o tempo que não tem.</div>
vezzonihttp://www.blogger.com/profile/06081816306861771433noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5022587951931208654.post-29078125899735314162012-12-11T13:48:00.000-02:002012-12-12T01:57:28.436-02:00A ultima carta do náufrago- Rolando Vezzoni<br />
Favores dados, nem sequer pedidos, demandam retorno?<br />
Dá-se algo para se conseguir alguma coisa apenas?<br />
Capitã da vida feita com infantilidade senil,<br />
da independência simulada e frágil que quer mostrar.<br />
Ora, de onde vem tamanho turbilhão de inconsistência e agressividade juvenil?<br />
Tem-se claro o mostrar absoluto do poder desacreditado e enfermo,<br />
da moral tão absoluta, nascida para ser quebrada e sofrida.<br />
Junto dessa moralidade sofrível chora a fraqueza do ato da ameaça pura e falsa,<br />
uma demanda boçal de algo que não se sabe, e a incapacidade do desculpar-se.<br />
Procurar, por errados meios, traz sequelas e cicatrizes exponenciais e irreversíveis aos próximos, sabe?<br />
Acalme-se, os quarenta são novos trinta... Tripulantes! cuidado com o ventre da mulher balzaquiana,<br />
pois nesse ventre quase fálico, reside a insegurança dos novos tempos.<br />
Tão forte, tão fraca, quer ser pai, mãe, tio, tia, professora, avô e avó, mas jamais uma amiga jovial.<br />
Em minha eterna contemplação (pretensamente silenciosa) e displicência carrego armas antigas.<br />
Já conheço as operações de Apolo, que levam um dia para trazer outro enquanto o mundo mantêm o ciclo: As flores caem e as saudades vão diminuindo.<br />
A despeito de apelos apolíneos, a atitude arbitrária de suas lamúrias progride feroz, visceral.<br />
Flutuo entre buracos, peregrino meios desconexos, sou um náufrago cansado.<br />
Aqui mais um adeus momentâneo, na iminência da próxima calmaria pré-tempestade, e mais uma mensagem na garrafa fica á deriva...<br />
Fique com a cautela se a encontrar flutuando, pois um homem não ameaça em vão, sei que quando enfim houver partido, realmente o terei feito...<br />
Nômades tem poucas garrafas, é a última carta do náufrago da ilha cerebral, contemplando a maré estúpida.vezzonihttp://www.blogger.com/profile/06081816306861771433noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-5022587951931208654.post-80164531156619848812012-12-10T00:10:00.004-02:002012-12-10T22:38:39.969-02:00A primeira noite do personagem- Rolando Vezzoni<div>
<br />
<div class="MsoNormal" style="background: #2F2F2F; line-height: 13.5pt; margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white; font-family: "Verdana","sans-serif"; font-size: 10.0pt; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR;">A folha caída só vale a pena por ter em
algum momento caído.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="background: #2F2F2F; line-height: 13.5pt; margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white; font-family: "Verdana","sans-serif"; font-size: 10.0pt; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR;">Existir problema não é problema, não
querer nada já é querer alguma coisa e caminhar despretensiosamente não é fácil,
se fosse fácil, o mundo seria também.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="background: #2F2F2F; line-height: 13.5pt; margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white; font-family: "Verdana","sans-serif"; font-size: 10.0pt; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR;">Cá em meus contos, vemos um personagem
quase sonâmbulo, vivendo suas histórias muito pouco épicas, um ateu
espiritualizado, um esforçado vagabundo vivendo suas suas crônicas
do desinteresse.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="background: #2F2F2F; line-height: 13.5pt; margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white; font-family: "Verdana","sans-serif"; font-size: 10.0pt; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR;">Outro dia mesmo, meu personagem
caminhava sem rumo num começo quente de noite de verão, lá pras vinte e duas
horas, como apenas os conceitos abstratos e sem nome caminham.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="background: #2F2F2F; line-height: 13.5pt; margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white; font-family: "Verdana","sans-serif"; font-size: 10.0pt; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR;">Acendeu uma ideia semi-concreta de
cigarro e escutou a projeção gráfica de um miado.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="background: #2F2F2F; line-height: 13.5pt; margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white; font-family: "Verdana","sans-serif"; font-size: 10.0pt; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR;">“miau!” pausa “miau!” pausa “miau”
pausa “miau”...<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="background: #2F2F2F; line-height: 13.5pt; margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white; font-family: "Verdana","sans-serif"; font-size: 10.0pt; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR;">Palavras costumam ser inertes, signos
complexos que funcionam de forma arbitrária em diversos contextos... Por aqui
“miau” é barulho de gatinho, onomatopeia consolidada.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="background: #2F2F2F; line-height: 13.5pt; margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white; font-family: "Verdana","sans-serif"; font-size: 10.0pt; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR;">“Ele”, como o personagem que é, simulou
dois pensamentos que provavelmente vieram do escritor, um que perguntava por
que o gato mia, e outro da diferença funcional do termo “gato” para com o termo
“medo”.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="background: #2F2F2F; line-height: 13.5pt; margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white; font-family: "Verdana","sans-serif"; font-size: 10.0pt; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR;">Elaborava sua tese a respeito da
complexidade do “medo” e da simplicidade de “gato”, que para bons entendedores
da língua portuguesa, é o bicho que faz “miau”.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="background: #2F2F2F; line-height: 13.5pt; margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white; font-family: "Verdana","sans-serif"; font-size: 10.0pt; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR;">Para o texto não ficar cansativo
encerrou suas especulações, e começou a procurar o gato que miava com medo de
algo.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="background: #2F2F2F; line-height: 13.5pt; margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white; font-family: "Verdana","sans-serif"; font-size: 10.0pt; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR;">Depois da exaustiva simulação de alguns
minutos perdidos encontrou o bichano, que era filhotinho e estava num muro
alto, e que provavelmente não estava conseguindo sair de cima, por isso a
barulheira aguda e desesperadora.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="background: #2F2F2F; line-height: 13.5pt; margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white; font-family: "Verdana","sans-serif"; font-size: 10.0pt; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR;">“Ei, gato, vem cá gato” se aproximando
com andar de um bom retardado, que apenas os animais merecem “vem cá com o tio,
eu te ajudo”.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="background: #2F2F2F; line-height: 13.5pt; margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white; font-family: "Verdana","sans-serif"; font-size: 10.0pt; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR;">O animal pareceu não entender muito bem
o que outro animal queria, mas deu alguma atenção por estar preso e com um
pouco de pena do humano patético.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="background: #2F2F2F; line-height: 13.5pt; margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white; font-family: "Verdana","sans-serif"; font-size: 10.0pt; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR;">“miau” podia muito bem estar sugerindo
terapia ou que eu saísse e arrumasse um enredo fictício mais interessante para
a história, mas como não manjo nada de semântica felina mantive meu personagem
tentando ajudar.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="background: #2F2F2F; line-height: 13.5pt; margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white; font-family: "Verdana","sans-serif"; font-size: 10.0pt; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR;">“Bom, vou subir o muro, ajudar meu
amigo novo”.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="background: #2F2F2F; line-height: 13.5pt; margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white; font-family: "Verdana","sans-serif"; font-size: 10.0pt; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR;">Começou uma escalada pseudo-heroica do muro,
com toda a capacidade de um homem desocupado.<br />
O muro era pequeno a princípio, sem problemas, mas como muros tem tamanho, e
tamanho é altura, e altura depende de medo, quando chegou ao final do alpinismo
urbano entendeu o porquê das lamúrias do gato, ficou com bastante incomodado
com a altura e com quão barata é sua coragem, bastava adicionar dois metros e
meio do chão para ele mesmo começar a miar.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="background: #2F2F2F; line-height: 13.5pt; margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white; font-family: "Verdana","sans-serif"; font-size: 10.0pt; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR;">O bichano o olhou desgostoso, como que
incomodado com sua companhia.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="background: #2F2F2F; line-height: 13.5pt; margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white; font-family: "Verdana","sans-serif"; font-size: 10.0pt; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR;">“Ei, qualé, eu vim te ajudar porra...”<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="background: #2F2F2F; line-height: 13.5pt; margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white; font-family: "Verdana","sans-serif"; font-size: 10.0pt; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR;">“miau”, mas agora, um miau maldoso,
típico de quem está pronto para o ataque.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="background: #2F2F2F; line-height: 13.5pt; margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white; font-family: "Verdana","sans-serif"; font-size: 10.0pt; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR;">“calma... calma...”<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="background: #2F2F2F; line-height: 13.5pt; margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white; font-family: "Verdana","sans-serif"; font-size: 10.0pt; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR;">Gatos são felinos, felinos enxergam bem
durante a noite, tem reflexos absurdos, o irritante hábito de caírem de pé e
unhas bem afiadas, unhas essas, que no caso, caíram sobre nosso herói
vertiginoso, que despencou de costas na grama todo arranhado e com o orgulho
bastante ferido.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="background: #2F2F2F; line-height: 13.5pt; margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white; font-family: "Verdana","sans-serif"; font-size: 10.0pt; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR;">Vendo o gato encima do muro, e se vendo
caído de forma pouco digna decidiu que era hora se ir embora daquele trecho de
conto maldoso.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="background: #2F2F2F; line-height: 13.5pt; margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white; font-family: "Verdana","sans-serif"; font-size: 10.0pt; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR;">Tentou levantar, mas resolveu respirar
alguns momentos, afinal, estava meio arrebentado.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="background: #2F2F2F; line-height: 13.5pt; margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white; font-family: "Verdana","sans-serif"; font-size: 10.0pt; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR;">O gato riu, gatos podem rir em meios
literários, afinal, eles são apenas uma representação de gato, depois ele
pulou, ainda sorridente, caiu de pé, e foi embora tranquilamente.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="background: #2F2F2F; line-height: 13.5pt; margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white; font-family: "Verdana","sans-serif"; font-size: 10.0pt; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR;">Anda difícil ser personagem hoje em
dia, ainda mais com escritores que tem medo de altura...<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="background: #2F2F2F; line-height: 13.5pt; margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white; font-family: "Verdana","sans-serif"; font-size: 10.0pt; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR;">Hora do personagem descansar um pouco,
afinal, acabou de ganhar vida e dor nas costas, como todos os vivos.<o:p></o:p></span></div>
</div>
vezzonihttp://www.blogger.com/profile/06081816306861771433noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5022587951931208654.post-54622766837577600502012-12-06T14:08:00.004-02:002012-12-06T14:08:43.468-02:00Memórias do quarto porco- Rolando Vezzoni<br />
“As boas histórias já acabaram...”<br />
Na livraria, vindo de um pai cansado demais para recomendar alguma coisa para a prole.<br />
“Vai lá com a tia que faz atividades, o papai vai tomar um café. ”<br />
Crianças correm e acham a tal da tia, que começa a contar uma fábula (tosca) com uma voz (forçadamente) cretina, daquele tom que o mundo costuma achar que agrada criança mas não agrada, afinal, ter voz fina e não ser levado a sério é um privilégio da molecada... Não é qualquer tia velha que sabe fazer isso com classe.<br />
“ohhhhhaaaa! Aí! Veio o lobo-mau! e...”<br />
Falta estilo e alguma criatividade na classe dos monitores infantis.<br />
Pivetes não gostam de ser tratados dessa forma... Isso é coisa de alguns séculos atrás quando não existiam zumbis virtuais a serem assassinados, Cartoon-network e internet.<br />
Entreter criançada demanda habilidade.<br />
Tomar um café. Sentei no balcão.<br />
“Café!”<br />
Torno o olhar para a encenação assustadora do suposto lobo-mal, um lobo que lembra muito uma mulher de um metro e cinquenta que acredita que está fazendo um trabalho fabuloso.<br />
“A história não importa, o que importa é quem conta ela”<br />
Olho para o lado, era o pai de antes.<br />
“Como essa mulher aí?”<br />
“Por favor, tenho cara de economista, , mas te sou um escritor... Uso camiseta pólo, penteio os cabelos e nunca publiquei nada, mas sou escritor.”<br />
“Eu também sou, e nunca publiquei.”<br />
“Mas você ainda não se escondeu, o mundo não quebrou seus parágrafos... Você é jovem.”<br />
“Do que você ta falando?”<br />
“Aqueles dois ali são meus filhos, sabe? Os dois que estão vendo aquela porcaria toda”<br />
“Criminoso o negócio lá, só aquela grávida abobada perto da prateleira de auto-ajuda ta curtindo de verdade”<br />
“Sim, eu mando eles lá pra já irem aprendendo a merda que é isso tudo... Eu sempre curti enredos e contos, escrevi algumas coisas quando era mais novo... Histórias que gostaria de ter lido na minha infância, ao invés de ter visto esse tipo de coisa.”<br />
Pausa, dá um gole no café já meio frio.<br />
“... Nunca publicaram nada, embora elogiassem bastante! E sabe porquê disseram que não iam publicar?”<br />
“Nem imagino.”<br />
“Porque para eles, seria perigoso mandar algo que não nivelasse por baixo, manja? Pra eles tudo tem que ser nivelado por baixo, só vende groselha hoje em dia. As histórias boas já acabaram, quando os caras gostam do negócio eles acham que molecada não vai achar bacana.<br />
“É porque o mundo se leva muito a sério e isso é uma merda, pretensão e auto-imagem transformam cartunistas em publicitários e escritores em advogados que depois acham que são muito importantes para não entender alguma coisa... Se não entendem algo, é porque é para criança ou não faz sentido... Como Alice no país das maravilhas, todo idiota fala que adora e nem percebem que é uma sátira da vidinha vagabunda que levam. ”<br />
“Exato! ‘poxa, gostei desse livro, mas como eu sou a porra do Einstein da contabilidade do prédio cinco meu filho jamais entenderá algo que eu gostei, vou comprar o livro sobre a pequena raposa disléxica que aprende sobre solidariedade “<br />
“Ou o moleque já tem catorze anos, e ganha um livro explicando o que é a masturbação... Cara, isso é o tipo da coisa que ele conhece muito bem. ”<br />
“Isso quando compra o livro, a menina pede o livro e a mãe fala que só vai comprar quando ela terminar de ler o outro, já pra comprar idiotice, tranquilo. ”<br />
“Complicado isso. ”<br />
“Você reclama assim só porque não é casado com uma dessas pessoas, aí você reclamaria como gente grande... Sentir pena de si é bacana. ”<br />
“Difícil cara... pra quê viver assim?”<br />
“A coisa, é que sou um agente-secreto, um infiltrado, e tenho que ir longe. A minha missão é entender o mundo vazio em toda sua ausência de conteúdo. ”<br />
“hahahahahaha, desencanou de escrever?”<br />
“Parei de mostrar, mas desisti de qualquer forma... Agora, VOCÊ tem uma missão. Contar histórias e reclamar das coisas, certo? É evidente que esse é o seu negócio. ”<br />
“Digerir é viver em dobro. ”<br />
“hoje em dia temos poucos momentos históricos em nossas vidas, sabe como resolver isso?”<br />
“Não. ”<br />
“Pegar nossas histórias vagabundas e contá-las da melhor forma possível... Acabaram as grandes navegações e as cruzadas acabaram junto com a magia das viagens espaciais... Fora que depois do bom cinema, criar novos mundos escritos perdeu um pouco o sentido, mentir para seu leitor é arbitrário, escrever sobre a vida de fato que é a colher dos corajosos. ”<br />
“Tem seu sentido. ”<br />
“Não faça como seu ‘eu’ velho e se esconda, se divirta com colhões, porque a vida já é miserável o bastante quando se sabe brincar com ela, não saber é dantesco... Aproveite sua alucinação e vá fazer alguma coisa, eu sou fim, o fundo, a desistência absoluta... Você é o que?”<br />
“momento. ”<br />
Ele riu, levantou e foi embora com os filhos enquanto o lobo continuava soprando a casa dos porquinhos num mundo que não aceita porquinhos sem ganância que moram em casas de madeira na praia.<br />
Já ia embora também.<br />
Abaixei para amarrar o tênis: laço pra cá, puxa para lá, ajeito tudo sem pressa, para ficar confortável... Momento, momento puro... Sempre escrevendo sobre a importância espiritual do ato de amarrar o cadarço.<br />
Há! Nem tomei o meu café!<br />
<div>
<br /></div>
vezzonihttp://www.blogger.com/profile/06081816306861771433noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-5022587951931208654.post-21916423904646723652012-12-03T13:52:00.001-02:002012-12-03T23:09:21.884-02:00Especial de dezembro parte 1: Rolando Vezzoni e a última noite do planeta azul<span style="font-family: "Calibri","sans-serif"; font-size: 11.0pt; line-height: 115%; mso-ansi-language: PT-BR; mso-ascii-theme-font: minor-latin; mso-bidi-font-family: "Times New Roman"; mso-bidi-language: AR-SA; mso-bidi-theme-font: minor-bidi; mso-fareast-font-family: Calibri; mso-fareast-language: EN-US; mso-fareast-theme-font: minor-latin; mso-hansi-theme-font: minor-latin;"><br />“Você
sabe o que vem hoje, né?”<br />
“Não”<br />
“O mundo acaba”<br />
“Num começa com neurose”<br />
Ela levanta, segue até a frente da televisão.<br />
“Eu tava te devendo um strip.”<br />
“oohhh, isso é interessante, nunca ganhei isso antes”<br />
“nem eu fiz”<br />
“então vamos fazer direito”<br />
Ele caminha, pega umas cervejas, despeja numa jarra e pega o copo e o cinzeiro.<br />
“não, quero você de camisa, gravata e cueca”<br />
“por quê?”<br />
“quer que o mundo acabe sem nunca ter ganho um strip? tem que contextualizar”<br />
“ok”<br />
Gravata, camisa, e uma cueca? Que cueca? Cueca do Snoopy, de natal com o
Woodstock de Noel, um brinde a dezembro.<br />
Volta, só uma luz de fundo acesa, clima bom, tocava Bee-gees.<br />
“poxa, Bee-gees não, fica gay assim... muda isso”<br />
Risos, sempre difícil manter a seriedade, mas isso é bom, pessoas sérias não
são companhias ideais para o fim.<br />
“o que então?”<br />
“jazz, pra ornar com a meia calça, que tal um sapato?”<br />
“só tenho tênis”<br />
“desencana, você ta linda”<br />
“é mais fácil assim, né?”<br />
“como?”<br />
“você só elogia na iminência do fim do mundo... parece que tem medo”<br />
“eu não tenho medo do fim do mundo, não faz muita diferença”<br />
“não é do fim do mundo que eu to falando”<br />
Silêncio e sorriso safado, melhor não discutir a vida quando se está vivendo.<br />
Jazz, andar lento, abrir latinha, acender cigarro, cara de bobo. Todo homem tem
que fazer cara de bobo na hora do strip.<br />
“Abaixa a mão, não pode tocar, ordens da casa!”<br />
“do que você ta falando?”<br />
“entra no jogo”<br />
“ok”<br />
Puxa a gravata, faz cara sexy e se afasta, ele tenta continuar sério, ela tropeça
um pouco no ritmo, tudo bem, falta de perícia é charme.<br />
“então, como é o seu nome?”<br />
“não posso falar, ordens da casa... me chama de Vênus”<br />
“se atendo aos clássicos”<br />
Fez tudo parecer mais real, a verdade é que sempre foi tudo clandestino por
ali, sexo e amizade na ilegalidade, fuga da moral alheia... Finalmente era um clandestino
digno do apocalipse.<br />
“Do que você gosta Srta Vênus?”<br />
“Gosto que puxe o cabelo, e de tapa, mas devagar”<br />
“Bacana isso”<br />
“Continua fumando, é sexy”<br />
“Sem problemas...”<br />
Sutiã que abre na frente, preto contra a pele clara, óculos escuros para
mamilos rosinhas.<br />
Rasga a camisa, morde o pescoço fraquinho.<br />
“isso é psicótico”<br />
“fica quieto aí”<br />
“ok”<br />
“do que você gosta?”<br />
“peitos, e que arranhe as costas”<br />
“só?”<br />
“eu logo penso em mais alguma coisa, por enquanto tudo certo”<br />
Pele, suor, dezembro é quente, os ameríndios sabiam.<br />
“pensa rápido, você tem mais algumas horas de vida”<br />
“até lá, já quero gasto umas 2000 calorias, para fumar meu ultimo cigarro”<br />
“Porque não acabar o mundo num orgasmo?”<br />
“O importante, é já ter gozado a vida, e ter alguns minutos, só para poder
lembrar”<br />
“lembrar do que?”<br />
“ De morrer vivendo e de viver morrendo... ”<br />
“Hãn?”<br />
“Que o fim não é o objetivo do meio, por isso a mulher, não minha mão. ”<br />
“é tudo troca, empatia “<br />
“se já teve isso, tudo bem, que venham
os titãs, Srta Vênus “<br />
Olha de baixo, belas sobrancelhas.<br />
Fricção, movimento, lábios, mulher, homem, orelha, unhas, sede, saliva, cevada,
pausa, giro, simbiose, agora troca, vai pra baixo, escapou, voltou, risos,
muitos risos, cai jarra, é um banho gelado, está tudo valendo, respiração,
aceleração, calma, descanso, fim de uma, calma, fim do outro...<br />
Isqueiro, teto, fogo, cinza e bagunça... Seria o sexo, um amor sem guerra?<br />
Tudo vale na última noite do planeta azul. </span>vezzonihttp://www.blogger.com/profile/06081816306861771433noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-5022587951931208654.post-84101647554147946382012-12-01T14:43:00.000-02:002012-12-01T14:45:37.925-02:00Para não esquecer- Caroline Bellangero<br />
O meu peito dói. constantemente ele grita para lembrar que ainda existe e, constantemente, eu o calo.<br />
Ele abriga uma saudade pesada d'um lugar longe no tempo, e sempre que estou só ele me lembra de uma história.<br />
<br />
Era uma manhã bonita como quase todas as lembranças de manhã que eu tenho de lá. eu chegava miúda e passava de braço em braço pelas gerações. era primeiro aquele colo quente e perfumado de minha mãe e depois o macio e carinhoso da vovó. Eliana, eu sabia, mas para todos, Lili. eu chegava lá cedo e continuava meu sono cortado, acordava só mais tarde, com o cheiro do café fraco. aquele lugar tinha um quintal grande coberto por uma parreira que dava uva fora de época e uma piscina esquecida. tudo lá tinha aquele mesmo cheiro doce, que se misturava ora com o café, ora com o feijão ou com os bolos no final da tarde. fubá com erva-doce, o melhor. e comíamos, falávamos, brincávamos. todo dia era carnaval fora de época. naquele quintal, sobrevoei o mundo em aviões imaginários, fui uma náufraga em ilhas hostis, fui camponesa, fui rainha e fui mãe. e ela comigo, a bordo de todas as fantasias por toda a tarde.<br />
Quando o céu das seis horas era tomado pelo escurecer do céu das sete, o quintal era lavado como um ritual de purificação, às vezes com um pouco de pressa. a casa se punha limpa e em ordem e ele chegava exigindo silêncio. sentava na ponta da mesa e esperava o jantar, embalado por copos atrás de copos de bebidas diversas. comíamos e ele ia ver televisão. ela, arrumava o resto da bagunça e arquitetava a minha despedida. daquele momento em diante, eu sabia que tudo ia acabar e devagar me fazia triste.<br />
Minha mãe aparecia para me buscar e no caminho de volta para casa algumas lágrimas silenciosas eram derramadas enquanto a cidade passava, deixando para trás o meu mundo de possibilidades.<br />
<br />
O tempo correu e eu ia me afastando cada vez mais de tudo isso. meu corpo cresceu e me cobravam uma postura mais sóbria que eu assumi sem dificuldades. o quintal comprido foi virando rotina só de domingo, para um almoço grande. os domingos foram acontecendo só de quinze'm'quinze. só de mês em mês.<br />
<br />
Até que um dia eu deixei o quintal preso em algum lugar lá atrás e fui para longe dali. você não teve escolha e ficou com o quintal e o ritual de lavá-lo nos finais de tarde. de vez em quando, ainda recebo suas ligações no começo da noite, a hora que seria depois do jantar, para você se despedir como fazia antes. eu sinto sua voz de saudade e meu rosto inunda com as lágrimas que ainda escorrem ao perceberem que eu não estou mais lá.<br />
<br />
O meu peito dói. constantemente, ele grita para não esquecer.vezzonihttp://www.blogger.com/profile/06081816306861771433noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-5022587951931208654.post-81518518518619782062012-11-30T19:40:00.000-02:002012-11-30T19:40:20.897-02:00Eclipse na terra dos ponteiros - Bruno Santana<br />
A lua apareceu no meio da cortina.<br />
Era delírio, alucinação, flashback ... Peguei no terço e rezei umas aves marias:<br />
Vovó dizia pra fazer isso quando estivesse perto de ficar louco.<br />
Mas ... Na verdade, era só a lua embotada em lágrimas.<br />
Sabe ... a lua chora todas as noites. É triste e solitária. Chora pelos homens, pelo amor e pela vida, mas é louca;<br />
chora de louca, é o que todos dizem.<br />
É só um pedaço de muita coisa flutuando em torno de outro pedaço maior e bem pior. Mas é assim que as coisas são:<br />
ponteiros desregulados, girando e confundindo; porque ponteiros são isso mesmo, são grandes filhos da puta.<br />
Mas o ponteiro só gira porque a fórmula diz pra girar. Sem fórmula, nada giraria. Nada giraria e tudo estaria certo.<br />
Fórmula é assim, faz girar mesmo e é melhor aprender o giro, que se não gira direito ou se não gosta de girar<br />
vômita mesmo, vomita tudo que tem no estômago.<br />
A lua fica nessa, girando e chorando. Chorando e girando. Gira e chora até alguém chorar por ela.<br />
Mas quem chora por ela é mais louco que tudo. Porque é chorar por um pedaço de muita coisa junta.<br />
É o mesmo que pegar areia na mão e chorar o estômago inteiro.<br />
<br />
Lua, Lua, Luazinha,<br />
O que ainda diriam de mim<br />
o que diriam todos os homens de sobrecasa ...<br />
<br />
eu que não choro<br />
mas olho pra você e pego no giro da tristeza e não durmo nadinha?<br />
<br />
O louco sou eu, mas também não ligo.<br />
Nem vou ligar<br />
Nem hoje, nem amanhã<br />
Que Hoje e Amanhã são humanos<br />
são mais das coisas loucas dos ponteiros<br />
ponteiros invejosos invejando o sol<br />
e esse sol<br />
esse solzão<br />
grande, bonachão e tudo mais<br />
esse sim<br />
esse é Amigo.<br />
vezzonihttp://www.blogger.com/profile/06081816306861771433noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5022587951931208654.post-52592412381352599912012-11-29T00:00:00.000-02:002012-11-30T00:03:15.468-02:00As jovens no meio do universo- Rolando Vezzoni<br />
Se alguém narrasse a vida, teria de ser muito cruel.<br />
Uma bela mulher, já feita, elegante e com aqueles pares de pernas que te matam.<br />
Uma menina-moça, já interessante e sexy a seu modo.<br />
Mulher ainda que jovem, sem o belo emprego, esperando fim do aluguel e a prestação de seu muito belo carrinho, não dormiu mais que três horas em dois dias.<br />
Desenhos muito bons, mas talvez não o bastante, será? Futuro e talentos escondidos na falta de qualquer coisa que fosse.<br />
A nova entrevista de emprego foi um belo fiasco, já imaginava mamãe a vendo voltar pra casa por não ter conseguido manter o apê, olhinhos reprovando, a menopausa torna as pessoas muito más, sabe?<br />
Terminou sua primeira grande história., tudo em páginas únicas e brilhantes, suadas.<br />
A frustração é cansativa, noites em claro são cansativas, pais também, pessoas próximas do limite não tem lágrimas... Morre de medo e ódio dos olhares que julgam e ainda nem existem, perder é complicado.<br />
Na mochila que leva nas suas costas tem seu mundo, o zíper só fecha até a metade, mas a caminhada é curta e lenta, não tem problema, ainda é moça, não dirige, não chora e não usa sapatos.<br />
Usa saltos altos, vermelhos e poderosos, sujos de barro da vaga, tudo estraga e está estragando no mesmo compasso que sua autonomia, as mulheres de hoje são estressadas como os homens de antigamente.<br />
Seu tênis batuca a calçada devagar, são duas ruas a se atravessar:<br />
Uma de ida e uma de volta com um canteiro no meio.<br />
Um amigo vai atravessar no sentido oposto, ela quer mostrar seu tudo, mas o medo é foda... Ele costuma pedir pra ver, mas como saber se o mundo gosta?<br />
Acelera com pressa, dirige como anda: rápido e com charme, nas alturas dos calçados altos.<br />
A noite é de verão, o chão sempre molhado da chuva de mais cedo.<br />
Gosta de como o vapor acaricia suas canelas, ele vem e ela vai, um olá no canteiro no meio do universo.<br />
Uma senhora na rua vira o volante e crava o solado pontiagudo no breque.<br />
Os olhares são tudo para pessoas que o mundo ainda não conseguiu quebrar, isso explica o canteiro no meio do asfalto selvagem.<br />
A velha, as velhas, depois de certa idade só morrem de velhice, mas o carro acelera.<br />
Ele pede para ver sua arte, ela dá desculpas, prolongam o momento para sempre, está ventando e seus cabelos loiros balançam, quer mostrar, mas sem muita pressa, “está ruim mesmo”.<br />
O pedal travado, o desvio desesperado, a velha só vai morrer de velhice, e o carro e a pista molhada entram no portal do acaso, ela chora com lágrimas negras de rímel, finalmente chegou ao seu limite, o medo faz isso.<br />
A mochila está nas costas, o zíper quebrado, o rapaz lá e ela ali, no canteiro, entre duas pistas eternas, ele vai se despedindo sem ver nada, tem que ir embora, ninguém viu nada ainda.<br />
Ela vê um jovem atravessando a rua de costas, dando adeus, o carro o iria engolir e não havia como mudar isso, está tudo escorregando e fora de controle sentido meio do mundo.<br />
Espera no canteiro o fim do adeus, tudo bem, ainda acha tem todo o tempo.<br />
O carro engole, e segue enquanto ela grita, a menina vira de costas e fecha os olhos.<br />
O impacto vem desacelerado pela grama e a guia que estoura os eixos do carro sem seguro.<br />
Folhas voando longe, um céu sem estrelas girando, reza a lenda que quando se voa é mais fácil de ver o mundo girando, tudo em câmera lenta num silêncio erótico.<br />
Suas costas acomodam no para brisa como em uma almofada, pegando o formato das costas protegidas pela mochila que vai se esvaziando, enquanto a mulher quebra a perna pressionando o freio que se destrava calmamente com o balanço do destino.<br />
Arte partindo, ossos fragmentando, homens morrendo, uma velha envelhecendo e o céu cinza descendo como um cobertor quente sobre duas sobreviventes, uma eternamente manca, outra eternamente saudosa.<br />
Duas cabeças vão se deitando no cômodo espaço belamente reservado pelo destino, sobreviver cansa, quando o bombeiro chegar elas poderão ir embora, agora tanto faz.<br />
Coisas, desejos e medos não protegem ninguém... A vida é um negócio complicado quando se está no centro do universo.vezzonihttp://www.blogger.com/profile/06081816306861771433noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-5022587951931208654.post-57225263950239546942012-11-28T23:13:00.001-02:002012-11-28T23:13:31.792-02:00Das merdas, a menor- Rolando Vezzoni e Bruno Santana<br />
-Meulámigo, tá osso esse tempinho em Sampa.<br />
-Me diga selvagem do concreto, como anda a brincadeira por aí?<br />
-Amplitude térmica de 120 graus.<br />
-Ridículo issoaí!<br />
-Isso porque não começou a chuva, aí é canoagem á pampa!<br />
-Que puta esculhacho!<br />
-E como é verão em Lins?<br />
-Verão de deixar cabra bronco.<br />
-Elabora a idéia companheiro dos confins!<br />
-Complicado explicar, o céu por lá é mais pra baixo... Na metrópole é alto, cinza e empalado pelos prédios... No<br />
interior tudo termina em pasto, o horizonte acaba no pasto.<br />
-Como assim?<br />
-Pronde cê olhe, tem pasto, é o fim.<br />
-E o cheiro, é grama e porteira?<br />
-Não, cheiro de merda.<br />
-Por quê?<br />
-Porque tem curtume e curtume fede pra caralho.<br />
-Por aí é merda, por aqui é bosta...<br />
-É pra cada um escolher o esterco que mais gosta.<br />
vezzonihttp://www.blogger.com/profile/06081816306861771433noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5022587951931208654.post-74212129269788645092012-11-26T22:16:00.003-02:002012-11-26T22:16:52.030-02:00(sem título)- Bruno Santana<br />
Nada espera na noite escura<br />
das estrelas mudas<br />
do céu da lua envergonhada.<br />
<br />
Brilhando por nada<br />
a lua calada<br />
Detrás da nuvem<br />
miúda<br />
miúda e<br />
apavorada.<br />
<br />
Nada espera na noite escura<br />
de gritos velhos<br />
familiares.<br />
<br />
A faca na orelha<br />
o prato quebrado<br />
o amor em fúria<br />
paixão é guerra.<br />
<br />
Nada espera na noite escura<br />
além do verso<br />
na rima fechada.<br />
<br />
Calcule o poema<br />
rime angústia<br />
espere nada.<br />
<br />
Mas nada chega<br />
nada fala<br />
aflige<br />
nada.<br />
<br />
Desisto da luta<br />
Desisto do amor<br />
Desisto da febre<br />
Desisto do céu<br />
<br />
Despeço do canto<br />
Despeço da flor<br />
Despeço da praça<br />
Despeço do som<br />
<br />
Mas o canto é a vida<br />
que encantou a flor<br />
assaltou a praça<br />
quebrou o asfalto<br />
berrou vitória:<br />
"<br />
a luta acabou<br />
é tempo do amor<br />
a febre é delírio<br />
o céu derramou<br />
"<br />
<br />
Não<br />
NÃO<br />
Não em poemas assim<br />
<br />
Despedaçados<br />
Desgovernados<br />
Desperdiçados.<br />
<br />
Nada,<br />
<br />
Nada espero.<br />
<br />
Espero,<br />
<br />
Des<br />
espero.<br />
vezzonihttp://www.blogger.com/profile/06081816306861771433noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5022587951931208654.post-20847932642432408252012-11-25T21:39:00.000-02:002012-11-25T22:24:55.156-02:00O bom selvagem no fim da noite- Rolando VezzoniSe era fim de noite ou começo de dia, dependia apenas deles.<br />
Olhar para cima queima os olhos, olhar para baixo é deprimente, olhar para frente é estupidez.<br />
O selvagem andando na idade dourada, falando com a deusa.<br />
“Mim querer banheiro e prosa livre, querer mulher e cheiro bom... querer ler conto curto que dura para sempre”<br />
-É isso que você quer senhor gorila de tênis?<br />
“Macaco não usa camiseta, só usa chapéu.”<br />
-Por quê?<br />
“Fazer reverência... Tirar chapéu e abrir cabeça.”<br />
Saber falar é mínimo, saber escutar é doloroso e ninguém sabe cantar.<br />
Alguns escrevem de olhos fechados.<br />
-Como os primatas se ocupam?<br />
“Macaco escova os dentes, escuta jazz e pede truco.”<br />
-Nos dias úteis também?<br />
“Não, fecham os olhos e... ”<br />
-Rezam?<br />
“Não. ”<br />
Pensar a respeito é cansativo, ignorar é arbitrário e sobreviver é inevitável.<br />
“Muita palavra. Pouco conteúdo. ”<br />
A deusa ri, as deusas sempre riem.<br />
Coça a cabeça e delibera, o bom selvagem sempre está deliberando antes da próxima soneca.<br />
-Alguma ideia para nos despedirmos, antes de Prometeu trazer o fogo? Depois disso não tem volta.<br />
“Então fazer semi-deus.”<br />
-É tudo que você quer?<br />
"Agora?"<br />
-Sim<br />
"É. "<br />
Andar faz parte, correr cansa e ficar parado é o fim da linha.<br />
Que venha Zeus e seus abutres!vezzonihttp://www.blogger.com/profile/06081816306861771433noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5022587951931208654.post-91652750911495243322012-11-21T17:34:00.002-02:002012-11-21T22:58:30.316-02:00Aos vencedores as coxinhas- Rolando Vezzoni<br />
Resolvi ir comer alguma coisa, tinha acabado a coca-cola em casa então me senti pressionado a ir até a padaria.<br />
A padaria sempre foi meu lugar de comer preferido, é um lugar mágico que tem coisas de supermercado e sanduíches que você pode pegar e comer lá mesmo, na hora, sem as pessoas ficarem te olhando feio e conferindo se você vai levar o pacote até o caixa para pagar depois.<br />
Quando era mais novo tudo era mais fácil, podia abrir uma coca-cola enquanto colocava as coisas bacanas que eu queria no carrinho dos adultos, ninguém partia do pressuposto que eu queria economizar 80 centavos do refri, pensavam apenas que eu estava com sede.<br />
Sentei naquele único lugar no balcão da padoca que sempre está sujinho e lindo lá te esperando, algo semi-programado, em padarias sempre haverá um lugar sujo especialmente para você.<br />
Fiquei olhando para aquela cúpula de vidro onde ficam os salgados cujo objetivo antes era ser comido por ser gostoso, e hoje em dia é comido por ser gostoso e entupir artérias e veias... O bacana do mundo de hoje é que tudo faz um puta dum mal do caralho, então fica bem mais gostoso. O cigarro dá câncer, coca-cola dá gastrite, coxinha dá enfarto, batata doce dá gases e peixe cru vagabundo dá caganeira... Existe toda uma variedade de doenças que você pode escolher no cardápio, e o mundo também virou um cardápio gigante com a doce certeza que não faz tanta diferença assim.<br />
-Opa! Amigo! Manda um pão na chapa com sabor de ponte-safena?<br />
-Tá vindo já chefe! Com bastante risco de derrame?<br />
-Sim, por favor! E emenda uma coca-cola zero cancerígena?<br />
-Claro, quer gelo prá dor de garganta?<br />
-Sem dúvida!<br />
Sentou do meu lado um casal, uma moça magra com aspecto saudável, e o sujeito era bastante forte, daqueles que dão tiro de suplemento e tomam Oxiolite pra ir à balada.<br />
A mulher foi e pediu um iogurte com granola e frutas vermelhas e um suco de melancia e alguma outra coisa impronunciável. O namorado pediu um sanduíche de peito de peru no pão integral com queijo branco, sem passar na “chapa suja de banha”... Pessoas que sabem exatamente como será seu pedido são complicadas.<br />
Pessoas que estão “cortando o carbo”, “fazendo a dieta da melancia marciana” ou qualquer outra expressão semi-saudável que tenha chego antes da doença em si ou que tenha um efeito antioxidante deveriam ser proibidas de ir em qualquer lugar com pessoas que realmente tem o ímpeto de se alimentar com alguma dignidade inútil, ou não, foda-se...<br />
O legal de falar “foda” é que cabe em um numero absurdo de lugares, existe o adjetivo “isso é foda”, existe o substantivo “aquela foda que se dá de manhãzinha”, locução verbal “a vida é uma foda-mal-dada” o verbo “fodeu” entre outros usos importantes dentro da língua portuguesa.<br />
Existem pessoas que costumam falar “foda-se” um numero incontável de vezes, geralmente com o intuito de se convencer que aquilo(o que quer que seja aquilo que for) não importa, afinal, se realmente não importasse, não mereceria um termo tão intenso.<br />
Chegou meu pedido.<br />
-Valeu chefe! Foi rápido hoje!- Juro por Zeus que não fui sarcástico. -Aproveita e me manda uma coxinha prá viagem?<br />
-Sem problemas meu amigo!<br />
Existem poucas pessoas mais amistosas que os caras que te servem no balcão, são parte de um sistema de camaradagem intrínseca.<br />
Comi meu orgástico suicídio em forma de lanche, peguei minha cicuta pra viagem e fui andando pra uma banca ali perto.<br />
-Quero aquele maço ali.<br />
-Cinco contos.<br />
-Aqui tem dez, quanto tá o refri?<br />
-Dois e cinquenta.<br />
-Ok.<br />
-Aqui seu troco, quer que eu lave a latinha?<br />
-Por quê?<br />
-Ela pode estar suja, pode fazer mal.<br />
-Eu acabei de comprar um maço de cânceres, concorda que vai longe da coerência lavar a latinha que me parece limpa?<br />
-Tó... Problema é seu.<br />
Saí sorridente, sentei no banco e abri meu livro, tem pessoas que tem uma vida inteira pra masturbar a saúde até morrer, eu já tinha aquela tarde de mormaço e algumas horas livres.<br />
Drummond dizia que nascemos grávidos de morte, eu já havia ganhado do mundo todo lembrando isso, eu era um campeão da vida maçante... Eu sou um vencedor no hall dos homens com uma missão, o único problema é que já esqueci a minha missão a muito tempo... Bom, aos vencedores as coxinhas.<br />
<div>
<br /></div>
vezzonihttp://www.blogger.com/profile/06081816306861771433noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5022587951931208654.post-29238642102683795982012-11-18T14:30:00.000-02:002012-11-18T14:38:54.777-02:00 'Os surdos estilosos' - Rolando Vezzoni<br />
Comprei tampão de ouvido.<br />
É borracha, é pequeno e é amarelo,<br />
um grande poder saber controlar o que se ouve...<br />
Titio Stan lee me disse que é responsa, procede?<br />
<br />
"que merda é essa no teu ouvido?"<br />
É a máquina do silêncio!<br />
O cara riu, botou seus fones e foi embora.<br />
Não pegou o conceito:<br />
Não escutar é fácil, difícil é não ouvir...<br />
Trocar barulho por barulho é um ímpeto estúpido.<br />
<br />
"A borracha amarela é ridícula!" pensei alto,<br />
mas ninguém escutou...<br />
Sou um surdo amarelo,<br />
num mundo de surdos estilosos.<br />
vezzonihttp://www.blogger.com/profile/06081816306861771433noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5022587951931208654.post-30306330569180703562012-11-16T23:41:00.000-02:002012-11-16T23:41:12.048-02:00 It's fine babe - Daniél Moody<br />
Had to pay a fee<br />
For cutting of a tree<br />
Once the fee was payd<br />
I was saved<br />
Because in jail<br />
The guy wanted my tail<br />
Now im free<br />
Just like the tree<br />
vezzonihttp://www.blogger.com/profile/06081816306861771433noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5022587951931208654.post-73433013225740707782012-11-16T10:25:00.003-02:002012-11-16T10:31:37.573-02:00Olhos-de-sol ao leste- Rolando VezzoniAs manhãs são incrivelmente matutinas...<br />
O Sol nasce rindo da sua cara, os passarinhos cantam e sujam os carros, os jornais aparecem nas portas das casas e o caminhão de gás apita sonoro, sim, é manhãzinha em Sampa, hora dos mosquitos irem pra cama e pros ratos saírem dela.<br />
Bom dia "eu"! Tirando ramelinhas, pra lembrar o mundo que não é cão vira-lata.<br />
Escovar dentes e limpar ouvidos...<br />
"será que escovo os dentes antes, ou depois do cafezinho?"<br />
Costuma questionar coisas estúpidas antes das nove.<br />
"adoro cotonete, cotonete dá barato", brilhante!<br />
Agora já um pouco mais acordado e com sono, percebe a tal da fome e a falta de querer comer... Náusea pela náusea, pra assustar todos os Sartres.<br />
"escovar dentes tira fome? Mas num é o café da manhã 'A' refeição?"<br />
Descer escadas e procurar lembrar do algo que certamente está esquecendo lá em cima, lembrar, subir de volta, resolver, descer, amarrar o sapato e olhar para a janela.<br />
"muita luz e pouca coragem, cadê os olhos-de-sol?"<br />
O relógio chama, também quer um bom dia... desencana do mau-humor inevitável.<br />
"fala seu relógio, qualé a boa?"<br />
Deu um tapinha carinhoso nele, "pára amigão, já saquei que tenho de vazar"<br />
O importante é aceitar a ideia, aceitar a ideia faz a coisa toda muito mais fácil.<br />
Existem coisas que integram o quadro matutino quarta-feirense paulistano, como o cheiro inexplicavelmente melhor da cidade, ou o numero inexplicavelmente maior de pessoas de mau-humor em carrinhos em diversos tons entre branco imundo e preto cheio-de-terra., o tom surreal e muito bonito alaranjado brilhante que os gases venenosos nos proporcionam.<br />
É a perfeita cruzada contemporânea, a jornada pós-moderna na cidade mais paçoquenta e barulhenta da porção oeste sul-ameríndia.<br />
Seu caminho é a leste, o Sol vem de lá e brinca de "retina cretina".<br />
Sempre se convenceu que tem fotofobia, só de neurose tornou-se algo parecido com. Se configurou algo positivamente impossível perambular por aí sem óculos em lugares ABERTOS em plena luz do dia (sim, apenas abertos, sempre teve asco de pessoas que usam óculos escuros em lugar fechado para fazer pressão, para usar olhos-de-sol em lugares fechados tem de ser cego ou estar de ressaca.).<br />
"ressaca pode porque ressaca é ressaca, e ressaca é foda"<br />
A sinfonia das buzinas é imperativa, se misturou ligando o rádio.<br />
"Booooooomdiaqueridoexpectador! Ares polares subiiiiindo a marginal!"<br />
Rádio por aqui é assim, parece narração de jogo de futebol, dinamismo desnecessário até pra previsão do tempo.<br />
"hoje é quaaaarta feira! 14 de novemboooorooooooaaa! Diaaa muuundial da DIABETEEEES!"<br />
Desliga o rádio, ri alto, respira:<br />
"Parabéns, parabéns diabetes! Parabéns pelo seu aniversário!"<br />
Sempre acorda asqueroso, mas hoje tudo bem, tudo certo quando temos alguma data para celebrar.vezzonihttp://www.blogger.com/profile/06081816306861771433noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5022587951931208654.post-55834867150987510412012-11-10T14:51:00.001-02:002012-11-11T13:56:36.520-02:00Adeus, Sr. Conto- Rolando Vezzoni<br />
<div class="MsoNormal">
<span lang="pt">Procurava começar uma história, mas não via bem por onde.<br />
Havia ideias desconexas, cruzadas cruzando-se, inconclusivas e
descontextualizadas.<br />
Olha pra cima, baixo e lados, coça a cabeça e encara o cachorro, tecla cinco e
volta seis.<br />
Já ia “desescrevendo” mais que escrevendo, era uma máquina de “desescrever” e não
existia quem tivesse tanto domínio da não-escrita como ele aquele dia.<br />
Volta ao vale tudo da memória... Apelar prum texto da própria vida?<br />
Que tal arrebatar o pileque? Bêbado bom não é o ultimo moicano, é o primeiro
morto-vivo... Aquele que passeia entre os mortos nos sofás de casas
desconhecidas, o primeiro a levantar e ir embora.<br />
Desistiu, a carteira tinha muito espaço vazio e tinha que sentar e escrever,
retornava ao arquivo cerebral, há de haver algo.<br />
Contempla uma ideia, era a tentativa: Atentíssima e morena... Riso, muitos risos e
non-scence, non-scence e muitos risos... boa ideia?<br />Claro que sim, mas não é bom colocar um ponto final nesse conto que não foi
escrito... Precisa de mais duração, mais tentativa... é esperar vingar na vida pra virar história.<br />
O tempo pelo tempo é o que desgasta um homem.<br />
Outra já foi muito texto, e caos, belo acaso causal, dum ocaso literário que
foi prum caso... Tem texto que abriga, e texto que dá briga...O ultimo trouxe
boa fortuna, mais um seguido de tópico semelhante seria desperdiçar aventuras.<br />
Teve também aquele que não virou, não foi e também não veio... A decepção é literária, mas quem escreve de
fossa é o Cartola, e não apetece nem boné.<br />Talvez estivesse bebendo da fonte errada... Saudade da época que escrevia dor, e
não sobre mulheres... A dor tinha pequeno charme, e fim em si mesma, tudo muito
mais fácil.<br />
Como faziam os grandes mestres? Tem de haver algo, pois não é de bloquinho e
biblioteca que se faz um escritor, enquanto não descobre a folha prossegue
ficando aquele algo meio muito simples, e absolutamente inválido.<br />
Um desenhista, quando acorda enferrujado, rabisca círculos e padrões desconexos
para soltar o traço... Começou a falar para soltar a língua e escrever para
soltar o verbo.<br />
Persistência é importante, o conto bate em sua testa, avisando que está pronto para
ir.<br />
Bom garoto! Mas por favor, na hora de sair de casa, cuidado... Tem gente que
nem desgosta e nem gosta, que gosta mas não tanto, ou que desgosta muito
pouco... Isso sempre dá mais ou menos na mesma apatia virulenta, cujo único
objetivo é fazer perder tempo deliberadamente.</span><br />
<span lang="pt">Faça amor ou ódio Sr. Conto,
vá a lugares, mas prometa jamais perder tempo da vida de ninguém, seja belo ou seja potente... Uma história não pode ser perda de tempo, há de ser a troca de horas por anos de outras vidas, é uma torca injusta Sr. Conto.<br />
Esse pretendia ser potente, tem que escolher se vai ser lírico, piada ou
foguete.</span><br />
<span lang="pt">E o tal do conto surgiu, cresceu, aprendeu a andar sozinho, como apenas os bons conseguem, e foi lá ganhar o mundo.<br />
A cada página um novo fôlego, e o hábito de não fazer merda nenhuma a respeito
de merda nenhuma. Ainda bem que os textos fazem tudo sozinhos, adeus Sr. Conto.</span></div>
vezzonihttp://www.blogger.com/profile/06081816306861771433noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5022587951931208654.post-38299332088135482662012-11-08T22:04:00.000-02:002012-11-08T22:17:36.712-02:00Em tempos de bichos escrotos(parte 3)- Rolando Vezzoni<br />
Estava com a típica cara de desamparo que carregava há alguns dias, mas já ia se acostumando com o contexto, o problema agora era outro, havia seguido o brilhante conselho dado por seu "novo" amigo:<br />
Não contar sobre sua recente perda de memória para sua namorada do século passado... Mas como o destino tortura os justos de forma sempre sádica e divertida, repassava os resultados num bar, fim de tarde carioca.<br />
-Ahahahahahahhahahahahahahah! neeeeeem fudendo!<br />
-Cara, não ri, na moral...<br />
Aparece um engraxate que simplesmente começa a “lustrar” seu chinelo de hospital.<br />
-Ei! o que cê ta fazendo?<br />
-Já foi tiu, começou pagou! – convicto o pentelhinho.<br />
-O quê? essa merda é de pano!<br />
-Num vai piorar!<br />
Peralta se introduz no assunto:<br />
-O pivete tá certo, esse seu chinelo ta ridículo...<br />
-Eu nem sei por que eu to com esse chinelo, mas é o único calçado que eu tenho!- cansado demais para impedir o pivete- Como eu vim parar usando isso?<br />
-É bom não lembrar cara, é bom não lembrar...<br />
O engraxate emenda rindo:<br />
-Paulistano é tudo maluco... Vem pro rio fazê cagada!<br />
-Ninguém ta falando com você!- respira fundo- Melhor não saber?<br />
-Tem a ver com seu pai “trinta quilos mais novo”, uma arma e um LP do Pink Floyd.<br />
-É, eu não quero saber...- a desistência é o melhor caminho em determinadas situações... Seu tio era um sábio vagabundo, que devia estar tirando meleca do nariz naquele momento temporal... - ele me reconheceu?<br />
-Cara, você num nasceu! Bom, enfim... Eu fiquei curioso com essa história com seu- em tom jocoso - "broto legal".<br />
Ignorando o pentelhinho e o tom do Peralta conta o ocaso de seu desespero:<br />
-A coisa é essa, eu tentei agir da forma mais natural possível, certo? Fui lá, dei uns beijinhos e tava tudo pronto pra ação... aí, quando eu fui verificar o subterrâneo ocorreu o problema...<br />
-hum...<br />
-Por alguns momentos eu havia me esquecido do contexto, mas eu acabei me lembrando quão recente era a playboy da Claudia Ohana e aí a porra ficou séria, lembrei da década, dos paradoxos e o cassete, aí me bateu um esgotamento e aí...<br />
-Aí não subiu!- Rindo alto.<br />
-A moça era ruim assim?- depois de deixar o chinelo completamente preto e borrachudo.<br />
-Não cara, é gatíssima, ele é o problema!<br />
-Cara, vai à merda!<br />
-Meu... Você broxou com tipo, “menos vinte e cinco anos de idade”, deve ser algum tipo de recorde!<br />
-É, paulistano broxa! Hahahaha! Cadê o dinheiro do serviço?<br />
-Fica na sua, você é um pivete virgem, como pode saber que não ia broxar se estivesse no passado?<br />
-Pirô? Eu fico duro vendo até novela do Globo! Fora que eu não sei o que tu tomô, mas essa conversa ta estranha pra caraio!<br />
-Daqui alguns anos as novelas vão ser as primeiras punhetas do seu filho, de onde eu venho só tem putaria às nove na TV aberta.<br />
Peralta cessa as risadas e olha sério, sinalizando que era para todos ficarem em silêncio, aí sussurra:<br />
-Ei, os caras tão ali! Não da pra enrolar até a noite, vamos ter que ir embora.<br />
-Que caras?<br />
-Como você acha que a gente ta com tanta grana?- disse sério- ganhamos uma fortuna apostando em resultado de jogo de futebol, que claro que eu manjava... Quebramos o ganha pão dos caras, e agora eles acham que temos algum esquema e querem pegar agente!<br />
-É deles que estamos fugindo então!<br />
-Deles e da polícia... É que a gente meio que não existe ainda, e temos grana de aposta... Fora que todo mundo mamava no dinheiro das apostas... É foda cara!<br />
-Então por que caralhos a gente foi ontem no pesqueiro perder tempo falando com aquele maluco do Serguei?<br />
-Meu, ele comeu a Janis, eu tinha que falar com ele... Aqui ele ainda é comunicável.<br />
-Mais ou menos...<br />
O pivete que não estava entendendo o que estava acontecendo, porém estava bastante decidido a respeito do que faria:<br />
-Não quero saber, ou eu vou junto contigo ou chamo os puliça e os nego maluco.<br />
-Tá. Vem logo caralho, vai com sorridente aí, eu vou buscar a minha mina e as coisas no hotel... O mais rápido possível, não sei dizer que horas porque meu relógio ta uns trinta anos pra frente.<br />
-Ei! Tio!<br />
-que foi?<br />
-broxa! Hahahahahhaha!<br />
<br />
(continua)vezzonihttp://www.blogger.com/profile/06081816306861771433noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5022587951931208654.post-27924233542238781402012-11-07T19:39:00.002-02:002012-11-07T19:39:51.089-02:00A Pasta Existencial - Bruno Santana“Não entendo de filosofia."<br />
“Como não entende? E todos aqueles livros da estante? Você lê ou apenas
passa os olhos?”<br />
“Não. Li todos. Mas não entendo de filosofia como deveria; não sei definir
coisas com propriedade.”<br />
“Poucos sabem e isso não é importante para você. Você cozinha: isso é
importante. Aliás, o que você colocou nesse molho!? Está divino!”<br />
“Os tomates estavam frescos ... eu gostaria de entender melhor o mundo.
Saber diferenciar o que é humano do que é natural ... quer vinho?”<br />
“Por favor ... Quase tudo é humano e , também, natural. Este delicioso vinho
é humano e natural. As uvas são naturais: crescem por maravilhas da botânica,
mas a escolha das sementes, do lugar, do adubo; a forma de extrair o suco,
fermentar, envelhecer ... isso tudo é humano.”<br />
“Pensando assim, tudo é humano e natural.”<br />
“Tudo é humano, mas nem tudo é natural.”<br />
“Não entendi ... me ajuda a lavar a louça?”<br />
“Depois do trabalho. Já tá dando minha hora.”<br />
“Tudo bem. Acabaram seus cigarros?”<br />
“Me deixa ver ....”<br />
“Não, ainda tenho dois. Pega o maço.”<br />
“Valeu, quer o último?”<br />
“Nem, pega pra você; não posso chegar com cheiro Marlboro no trabalho.”<br />
“O.K.”<br />
“Enfim, tudo é humano, pois você é humano. Seu mundo existe a partir de sua
humanidade e ela é quem coloca o humano nas coisas.”<br />
“Não sei se concordo.”<br />
“Nem deveria, já disse que não penso direito de barriga cheia. Ainda mais
com um macarrão desses. Um dia você me faz explodir de tanto comer.”<br />
“É sempre a intenção.”<br />
“Bom, estou de saída. Abre o portão, por favor.”<br />
“Tá aberto. Pega a roupa na Dona Luzia quando voltar?”<br />
“Busco em troca de mais macarrão.”<br />
“Combinado.”<br />
“Até então.”vezzonihttp://www.blogger.com/profile/06081816306861771433noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-5022587951931208654.post-60047655809016056322012-11-04T23:51:00.000-02:002012-11-05T00:14:30.723-02:00E algo há de acontecer- Rolando Vezzoni Eu tava voltando d'algum cinema dia desses, fui sozinho e até queria ter ido acompanhado mas a preguiça falou mais alto.<br />
Meu pulso coçava por baixo do relógio, e era uma coceira maldita...<br />
<div>
O ponto de ônibus era gigante, a Paulista era gigante, e creio que em absoluto a coisa toda era imensa, eu estava tão imerso em meu micro-mundo que ignorei toda a ideia sobre o tamanho das coisas por alguns momentos.<br />
<div>
Será que a noção de meu tamanho miserável no meio da fumaça cósmica aumenta meu tamanho? Se tenho noção que sou mínimo e entendo o macro, posso ser gigante também. O céu é o limite pros homens bons, o átomo pros homens brilhantes, e a mente é meu limite, não pretendo sair muito dela.<br />
Deixei de lado o meu espaço expandido quando senti um cheiro bom, era tão bom que destoava do ambiente cor de mercúrio metropolitano, era sutil e sublime, até engraçado se destacar tanto no meio da fumaça quase sólida dali.<br />
A dona do perfume era uma menina magrela e bastante charmosa, que ia além da minha competência saber a idade (até onde sei poderia estar entre os 15 e os 25 anos).<br />
Nunca fui bom com questões temporais... também nunca usei relógio mesmo, até me perguntava a razão de estar usando um aquele dia. E era esse o motivo de tanta coceira... Talvez eu tenha alergia ao tempo e por isso não saiba que sessão de cinema que eu assisti, a idade da menina cheirosa e também a razão de eu ter tido preguiça de ligar pra alguém pra ir comigo... Sou filho da preguiça do Mário de Andrade: "Aaaaaiiii que preguiça!".<br />
Olhei pra ela, ela escutava musica e olhava pra frente, sua figura não me era estranha, mas não ia tentar lembrar naquele momento de onde poderia caralhos conhecer-la por eu estar demasiadamente ocupado tentando chutar que musica ela escutava.<br />
Acabei desistindo depois de rir alto imaginando algo como mamonas assassinas, por algum motivo que me foge a razão, então comecei esperar alguma coisa acontecer.</div>
<div>
Esperar algo acontecer é uma tarefa que demanda bastante criatividade e descontração, poucas pessoas conseguem esperar qualquer coisa acontecer com competência, acabam indo rápido pros clichês de comédia romântica norte-americana.</div>
<div>
Primeiro imaginei o que aconteceria de eu desse um susto nela:<br />
-UAAAHH!<br />
-AHH!<br />
-olá, muito prazer!<br />
-Você tem algum problema?!<br />
Depois especulei o que aconteceria se uma merda de pombo caísse nela, ou se aparacesse um mendigo tocando bongô e sugerisse que nos casássemos, ou então ela começasse a fazer um strip em plena paulista, entre outras situações insólitas e imbecis.<br />
Mas o que aconteceu foi chegar meu ônibus, que por acaso era o mesmo dela. Nós entramos e ela sentou no fundo, e eu quase no fundo, perto o suficiente pra dar pausas contemplativas na leitura do meu quadrinho do homem-aranha para olhar pra ela, mas longe o suficiente para não me destacar como o stalker mais vagabundo do século vinte e um.<br />
O fato de termos entrado no mesmo ônibus era alguma coisa, e eu estava esperando alguma coisa acontecer... Talvez menos interessante que minhas ideias originais, mas certamente alguma coisa.<br />
O interessante de pessoas como eu, é que sempre esperamos muito por algo acontecer, para que quando aconteça, possamos não fazer absolutamente nada a esse respeito... Não sei ao certo explicar isso, mas creio que é uma mistura covardia com vagabundice, provavelmente dois terços de vagabundice e um de covardia pra contextualizar.<br />
Contemplei a janela enquanto teorizava minhas razões de ser, mas São Paulo não te permite teorizar nada olhando para a janela, pois sempre tem algo surreal acontecendo, uma perola selvagem nas calçadas e ruas imperativas, como, no caso, um cadeirante pegando rabeira no para-choque traseiro dum caminhão de lixo que andava, acredito eu, a uns cinquenta quilômetros por hora.<br />
As terras paulistas deixaram de fazer sentido a algum tempo, o clima flutua, aleijados pegam rabeiras e pombas cagam em fichários... Ainda bem que sempre tem alguns sujeitos perturbados com ímpeto suficiente para anotar esse tipo de coisa.<br />
Escritores são ladrões de realidade, pegamos ela, rasgamos e costuramos ao nosso modo: Ela está lá, prontinha pra ser mastigada, cuspida e depois levar título e assinatura.<br />
Dei uma risada abobada, que me presenteou com o olhar dela, mandei um olhar desconcertado e ela respondeu com um sorriso de vergonha salpicada de empatia.<br />
O ônibus parou, e saímos na mesma parada, ela era quase minha vizinha.<br />
Como diriam os Titãs: "O acaso vai me proteger enquanto eu andar distraído".<br />
-Ei!- disse meio baqueado pelas estatísticas probabilísticas cósmicas universais surreais mínimas óbvias e assustadoras (haha!)</div>
<div>
-Oi?- confusa.<br />
-Viemos dum ponto a outro no mesmo busão!</div>
<div>
-É... eu sei - sorridente.</div>
<div>
-Somos quase vizinhos, e "viajamos" pela metrópole maldita juntos... Acho justo perguntar seu nome!<br />
-Sim, é justo.- simpática- bastante justo.<br />
Oh! Zeus... Ainda bem que as pombas não cagaram nos fichários esse dia! </div>
</div>
vezzonihttp://www.blogger.com/profile/06081816306861771433noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5022587951931208654.post-60857330285537276092012-10-31T15:10:00.000-02:002012-10-31T15:10:33.714-02:00Um Poema Karamazoviano - Bruno Santana<br />
a mágica absurda do escuro<br />
o brilho dentrífico<br />
a pele translúcida<br />
o riso de escárnio<br />
<br />
o Gato passa correndo.<br />
<br />
a aura não está adequada<br />
o sentido está perturbado<br />
a roupa está rasgada<br />
o sangue está sombrio<br />
<br />
o Gato volta.<br />
<br />
o sangue é forte<br />
a decisão é sombria<br />
a escolha é firme<br />
a noite é companheira<br />
<br />
o Gato espreita.<br />
<br />
o olho torto<br />
o bigode<br />
a encruzilhada<br />
a angústia<br />
<br />
o Gato contabiliza.<br />
<br />
o pilão<br />
a pistola<br />
o hábito<br />
a cruz<br />
<br />
o Gato pára.<br />
<br />
Golpe<br />
Espasmo<br />
Tombo<br />
Riso<br />
<br />
Riso<br />
Riso<br />
Riso<br />
Riso<br />
<br />
o Gato delira:<br />
<br />
" o pai,<br />
o pai,<br />
o pai,<br />
o próprio pai!<br />
<br />
o pai do sangue morreu!<br />
<br />
Dmitri não é assassino<br />
Aliócha é o parricida! "<br />
<br />
" Quem diria Aliócha!<br />
O que diria seu Stárietz !? "<br />
<br />
firma Behemoth e<br />
enrola o bigode.<br />
<br />
acende<br />
e passa ao novo herói:<br />
<br />
o Primeiro Cigarro Ateu.<br />
<br />
Ivan está em júbilo<br />
Dmitri está em liberdade<br />
<br />
<br />
<br />
O demônio está desesperado.<br />
vezzonihttp://www.blogger.com/profile/06081816306861771433noreply@blogger.com0